Ano novo, velhos ataques!

Lula, Dilma e FHC, diferentes entre si, mas compartilham o mesmo patrão - O grande capital
Ano novo, velhos ataques!
 
 


Governo intensifica retirada de direitos com nova “reforma” da previdência.

CCLCP - Quando “a esperança venceu o medo”, ou seja, quando Lula chegou à presidência da República em 2003, havia sim a esperança de que os anos nefastos de Collor e FHC tivessem ficado para trás. Havia a esperança de mudança na política econômica ditada pelo FMI; havia esperança no fim da financeirização da economia; havia esperança no combate aos transgênicos; havia esperança na efetivação da reforma agrária, com democratização do acesso a terra; havia esperança no fim da privatização do Estado brasileiro. Mas, sobretudo, havia sim a esperança de que os direitos sociais estariam protegidos dos ataques de governos subservientes aos ditames do capital.

Collor abriu o caminho da privatização do Estado, da desregulamentação e financeirização da economia. Sua política econômica provocou uma brutal reestruturação produtiva, levando à desindustrialização inúmeros setores e ao aumento do desemprego. Quem conseguiu permanecer no emprego vivenciou a intensificação dos ritmos da produção e aumento da jornada de trabalho, além de amargar o achatamento salarial.

Com o Plano Real, FHC deu o primeiro passo a total abertura do mercado brasileiro ao capital internacional. Seguia a política de desregulamentação de Collor reduzindo drasticamente o investimento estatal, dilapidando o patrimônio público através de fraudulentas privatizações. Não só leiloou a preço de banana empresas estratégicas para a soberania nacional como sucateou os serviços públicos atacando os diretos sociais, apresentados ora como “privilégios”, ora como “injustiças”, mas sempre colocados como “financeiramente inviáveis”. A redução dos investimentos nas políticas sociais voltadas para a massa trabalhadora, e seu consequente sucateamento, forneceu os argumentos que FHC precisava para justificar seu ataque, notadamente à Previdência.

A contra-Reforma da Previdência de FHC, em 1998, alterou a forma de contagem do tempo de aposentadoria. O tempo de trabalho foi substituído pelo tempo de contribuição, obrigando os trabalhadores a comprovarem que de fato trabalharam e contribuíram. Antes a prova cabia aos patrões. Posteriormente, FHC criou o fator previdenciário, uma regra matemática que diminui o valor do benefício, quanto mais jovem o trabalhador ou trabalhadora alcança o tempo para se aposentar, prejudicando aqueles que começaram a trabalhar muito jovens. Mudou também as regras para a concessão da aposentadoria especial, prejudicando os trabalhadores de áreas perigosas e insalubres, além dos professores, que na prática perderam o direito à aposentadoria aos 25 anos de serviço.

Mais nefasto que o prolongamento do tempo de trabalho, foi a adesão do então presidente da Central Única dos Trabalhadores – CUT, Vicentinho, ao projeto de FHC. Seu apoio garantiu a desmobilização dos trabalhadores.


Ricardo Antunes registrou suas impressões:

“O país da Era FHC é hoje socialmente devastado, Desindustrializado, submisso ao sistema financeiro internacional, paraíso produtivo das transnacionais que frequentemente se apoderam dos recursos públicos dos estados, (...). Um país cujos índices de criminalidade nos inserem em uma guerra civil despolitizada, conduzida pela criminalidade e pelo narcotráfico, num subsolo social adocicado pelo coro das Igrejas Universais de um universo desencontrado e socialmente destroçado”.

[1]

O primeiro ano de mandato do filho do Brasil – nordestino/retirante/operário – logo frustrou aqueles que alimentavam perspectivas de mudanças. O acordo firmado por Lula com o capital estrangeiro com o sugestivo nome de “Carta ao Povo Brasileiro” não tardou em ser cobrado. O governo Lula protagonizou o desmonte do regime próprio de previdência dos servidores públicos. Sua contra-reforma abriu caminho para a privatização da previdência, com a instituição do teto para os benefícios e a criação da previdência complementar. Lula definiu em lei que obrigatoriamente um agente financeiro deve participar da constituição desses fundos, criando um mercado gigantesco para os banqueiros explorarem.

Além disso, a reforma de Lula estabeleceu a taxação de inativos (aposentados e pensionistas), definiu uma idade mínima para a aposentadoria dos servidores públicos vinculando-a com o tempo de contribuição, o rebaixamento dos valores das pensões e o fim da paridade e integralidade dos vencimentos dos servidores frente aos salários dos colegas da ativa.

Para aprovar a reforma Lula acionou os mecanismos clientelistas tradicionais da política brasileira: compra de votos com cargos no governo e nas empresas estatais e com pagamento em dinheiro vivo – o “MENSALÃO”. Para dobrar a resistência dos servidores públicos, contou com o total apoio da CUT. Seu primeiro presidente, Jair Meneguelli, foi à imprensar defender a reforma. A direção da CUT defendeu a instituição de um tento previdenciário e consequentemente a criação das aposentadorias complementares em substituição a aposentadoria integral. Assim como o governo, também a CUT não debateu o tema com sua base. Ao contrário, optou por participar do fórum tripartite constituído pelo governo e composto em sua maioria por grandes empresários devedores da previdência, ao mesmo tempo em que se colocava abertamente contra a greve nacional dos servidores públicos federais deflagrada contra a reforma.

Surpreendente foi o argumento utilizado para acelerar sua aprovação: era preciso acabar com o privilégio dos servidores. Mirando nos SPF acabou por abrir caminho para depois atacar também os direitos dos trabalhadores da iniciativa privada. E essa foi a tática do governo, dividir os trabalhadores do setor público e do privado para avançar na retirada de direitos.

Era a História se repetindo como farsa. Passados dez anos do maior ataque a classe trabalhadora, vindo de um presidente operário, chegou a vez da presidente mulher, ex-militante de esquerda que lutou contra a Ditadura Militar preparar seus ataques.

O Congresso Nacional estuda novas mudanças na Previdência e entre seus principais pontos estão ampliação da idade mínima para 65 anos, fim da diferenciação por sexo, idade e categoria profissional, o que configura um novo ataque ao magistério, e fim da vinculação com o salário mínimo e o estabelecimento de um teto previdenciário e previdência complementar, o que significa que quem quiser se aposentar com proventos maiores do que aqueles estabelecidos pelo regime geral ou regime próprio (Estados, municípios, DF e União), terão que recorrer a previdência complementar, ou seja, aos fundos de pensão.
 
 
Dispositivo
Como é hoje
Proposta novos entrantes
Aposentadoria por idade
Carência: 15 anos.
Idade: 65 anos (homem);
60 anos (mulher).
Carência: 25 anos.
Idade: 65 anos (homem e mulher).
Aposentadoria por tempo de contribuição
Sem idade mínima.
Contribuição:
35 anos (homem);
30 anos (mulher).
Idade: 60 anos (homem e mulher).
Contribuição: 35 anos.
Pensões por morte
Não há restrições.
Imposição de condicionalidades que reflitam o grau de dependência do cônjuge ou parceiro sobrevivente e filhos.
BPC assistência social
Valor vinculado ao salário mínimo.
Idade: 65 anos.
Fim da vinculação ao mínimo.
Valor inferior ao do piso previdenciário.
Atualização pela inflação passada.
Idade: 70 anos.
Piso previdência social
Valor vinculado ao salário mínimo
Fim da vinculação ao mínimo.
Atualização pela inflação passada.
Diferença por sexo, setor e categoria profissional
Diferencial de menos 5 anos na idade e tempo de contribuição para:
mulher;
professor em sala de aula;
trabalhador rural.
Fim do diferencial.
Previdência do servidor público
Não regulamentada.
Regulamentação. Instituição da previdência complementar
Fonte: Centro de Estudos da Consultoria do Senado[2]
 


Desde 1998, com a primeira reforma da previdência de FHC, os argumentos são os mesmos: acabar com “privilégios”; acabar com o “déficit”; e seguir a “tendência mundial”. Mas na França, mesmo em crise, o novo presidente que derrotou o direitista Sarkozy, François Hollande, diminuiu a idade da aposentadoria de 62 para 60 anos. Na Bolívia, Evo Morales diminuiu de 60 para 58 anos e 56 para as atividades insalubres. Porém, os avanços mais significativos em relação a legislação trabalhista se operou na Venezuela. Às vésperas do 1º de Maio de 2012 o presidente Hugo Chavéz promulgou a nova Lei Orgânica do Trabalho. “A reforma foi formulada a partir de mais de 19 mil propostas, em sua grande maioria proveniente de sindicatos e outras organizações de trabalhadores. Entre as principais novidades da nova lei, conhecida como LOT, estão a volta da retroatividade da previdência social, que garantirá os benefícios com base no último salário, o pagamento de indenização dobrada em caso de demissões injustificadas, a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais e o fim da terceirização no ambiente de trabalho.”[3]

Em contradição com os governos progressistas na América Latina, o Brasil, governado por um partido que se denomina “dos Trabalhadores”, que teve como presidente um líder operário, assume a agenda do grande capital e impõe a retirada de direitos como medida fundamental para salvar os capitalistas da bancarrota.

A nova contra-Reforma da Previdência impõe ao movimento sindical a retomada com força e consequência da velha bandeira da redução da jornada de trabalho e do tempo de trabalho. A prolongação do tempo de trabalho, experimentada desde a primeira reforma, acarreta em aumento do desemprego. Mas, mais do que isso, acarreta em perda de tempo e espaços de sociabilidade humana. Marx observou que “o tempo é o campo do desenvolvimento humano. O homem que não dispõe de nenhum tempo livre, cuja vida, afora as interrupções puramente físicas do sono, das refeições, etc., está toda ela absorvida pelo seu trabalho para o capitalista, é menos que uma besta de carga. É uma simples máquina, fisicamente destroçada e espiritualmente embrutecida, para produzir riqueza alheia.”
[4] A luta pela redução da jornada e do tempo de trabalho torna-se cada vez mais fundamental para o desenvolvimento humano. Mas para avançar nas conquista será preciso antes derrotar os atuais ataques e superar a crise enfrentada pelo sindicalismo brasileiro marcada entre outras coisas pelo total atrelamento da CUT à ordem e ao governo.

Na reforma de FHC e de Lula a CUT foi o instrumento desmobilizador da massa trabalhadora. A luta contra este novo ataque terá que ser articulada por fora e contra a CUT. Mas principalmente contra um governo que registra um alto índice de aprovação popular. Qualquer setor minimamente comprometido com os interesses dos trabalhadores não pode se calar diante desta barbárie. É o silêncio das Centrais governistas que tem garantido o sono tranquilo dos governos petistas e – entre outros elementos – seus altos índices de aprovação.


[1] ANTUNES, R. A desertificação neoliberal no Brasil (Collor, FHC e Lula). 2ª Ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2005, p. 46.
 
 
 
Fonte : Corrente Comunista Luiz Carlos Prestes - CCLCP  em http://www.cclcp.org/index.php/inicio-cclcp/nacional/221-ano-novo-velhos-ataques
 
 

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