Alicerces do capitalismo social laico-cristão
Alicerces do capitalismo social laico-cristão
Ser-se solidário para com os que mais precisam, é direito de cidadania. Organizar essa intervenção no sentido da conquista de maior lucro e de mais poder, representa prática intolerável.
Qualquer reflexão que possa ser feita sobre os conteúdos e objectivos do Banco Alimentar Contra a Fome não deve esquecer que ele faz parte de uma central católica mundial que, na Europa, declara interligar 26 810 ONG e IPSS. Este movimento inscreve-se no quadro mais alargado do Voluntariado Cristão que no seu todo mobiliza alguns milhões de pessoas. Baseado no trabalho gratuito, o movimento favorece o entendimento entre os desapossados e as grandes empresas exploradoras e procura servir de almofada à luta de classes. Os BACF adoptam a estrutura empresarial capitalista e estabelecem-se como lóbis não lucrativos ligados por protocolos a grupos económicos que se movimentam na esfera ferozmente lucrativa dos monopólios.
Isabel Jonet, actual presidente do Banco Alimentar português reconhece implicitamente a natureza de classe destas instituições ao afirmar, em crise aberta do capitalismo, que os BACF são bases logísticas do mundo patronal. Entre nós, a constituição do primeiro banco alimentar (1991) é recente, tendo permanecido na sombra na sua fase inicial. Vivia-se então em tempos de vacas gordas e a grande crise era uma realidade oculta. A sua imagem real não tinha chegado ao povo. O poder político apelava ao consumismo e ao recurso ao crédito fácil.
Só mais tarde, a partir da primeira década dos anos 2000, com o desmoronar da economia europeia e o agravamento brutal do desemprego, a intervenção político-social dos bancos alimentares ganhou as honras das primeiras páginas. O plano visava pôr em prática a doutrina da Igreja como alternativa à intervenção do Estado Social. Assim, os BACF só cresceram à custa das angústias causadas nas famílias pelo brutal saque promovido pelo grande capital.
Foi um percurso extremamente contraditório: a acção social católica aceitou, em nome do combate à miséria, aliar-se àqueles que promovem a pobreza; e todo o edifício caritativo entretanto erguido, embora afirmasse o respeito pelos realizações do Estado Social, ia destruindo as suas instituições. Com intimidações e falsas promessas. Assim se percebeu que as metas a atingir seriam, pura e simplesmente, o controlo da revolta popular e a substituição da natureza do Estado.
O projecto do Banco Alimentar surgiu na área dos Jesuítas e foi nela que se estruturou. Porém, todo o aparelho assim instalado seria aparentemente autónomo e alheio a pressões e influências político-partidárias, estatais ou religiosas.
A realidade mostrou ser o oposto de tudo isto.
O Banco Alimentar contra a Fome apresenta-se à opinião pública como um espelho das virtudes cristãs. Mas como o mundo é cada vez mais pequeno, são já conhecidos detalhes das suas actividades que mostram o que se passa nos bastidores da acção: o BACF é financiado pelo Estado (1,2 milhões de euros, só em 2011 ), pelo Programa de Ajuda a Carenciados, dos fundos comunitários, pelos 80% das pensões que os pensionistas dos chamados «lares» (quase todos da Igreja) pagam como renda, por misteriosas verbas contabilizadas como «proveitos», etc. Acrescente-se, de passagem, que o BACF é uma IPSS e, como tal, não paga impostos.
Noutro sentido, os «donativos» recolhidos nunca são directamente entregues pelo banco aos mais carenciados. O BACF limita-se a distribui-los pelas IPSS ou outras instituições designadas pelos seus gabinetes técnicos (quase todos provenientes da Universidade Católica): lares, centros de dia, centros paroquiais, conferências vicentinas, etc., todos ou quase todos eles de obediência católica.
O Banco Alimentar é uma espécie de placa giratória que anima mercados e financia os cofres da caridade católica.
por Jorge Messias
«Uma nova Concordata traduzirá, como se espera, no domínio próprio da cada uma das partes (comunidade política e Igreja) o serviço da vocação pessoal e social dos mesmos homens. E tanto mais eficazmente exercitarão esse serviço quanto melhor cultivarem entre si uma sã cooperação, tendo em conta as circunstâncias do lugar e do tempo» (José Policarpo, cardeal Patriarca, Outubro 2012).
«É importante que tenhamos a noção de que o Estado não poderá chegar a todas as situações se não tiver a humildade de pedir ajuda a quem nasceu para ajudar… É isso que estamos empenhados em fazer. Com as Misericórdias, a acção social é muito mais eficaz porque é feita de parceria !» (Pedro Mota Soares, ministro da Solidariedade e Segurança Social, X Encontro das Misericórdias).
«Mais do que irmos à procura de novos parceiros, cuidamos dos que temos. Porque entendemos que quando as empresas confiam no BACF, têm a expectativa de que a relação de parceria vai ser acarinhada. O que fazemos é cuidar dos nossos parceiros... Em Portugal, o Banco Alimentar (BACF) e 19 outros BACF ajudam uma rede distribuidora de 2047 instituições de solidariedade social, às quais fornecem ferramentas de gestão e organização, voluntários (através da Bolsa de Voluntariado e bens não alimentares, garantidos pelo Banco de Bens Doados). Temos estruturada uma rede de apoios e alimentos, competências e voluntariado qualificado» (Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar, jornal OJE, 22.12.2011).
Ser-se solidário para com os que mais precisam, é direito de cidadania. Organizar essa intervenção no sentido da conquista de maior lucro e de mais poder, representa prática intolerável.
Qualquer reflexão que possa ser feita sobre os conteúdos e objectivos do Banco Alimentar Contra a Fome não deve esquecer que ele faz parte de uma central católica mundial que, na Europa, declara interligar 26 810 ONG e IPSS. Este movimento inscreve-se no quadro mais alargado do Voluntariado Cristão que no seu todo mobiliza alguns milhões de pessoas. Baseado no trabalho gratuito, o movimento favorece o entendimento entre os desapossados e as grandes empresas exploradoras e procura servir de almofada à luta de classes. Os BACF adoptam a estrutura empresarial capitalista e estabelecem-se como lóbis não lucrativos ligados por protocolos a grupos económicos que se movimentam na esfera ferozmente lucrativa dos monopólios.
Isabel Jonet, actual presidente do Banco Alimentar português reconhece implicitamente a natureza de classe destas instituições ao afirmar, em crise aberta do capitalismo, que os BACF são bases logísticas do mundo patronal. Entre nós, a constituição do primeiro banco alimentar (1991) é recente, tendo permanecido na sombra na sua fase inicial. Vivia-se então em tempos de vacas gordas e a grande crise era uma realidade oculta. A sua imagem real não tinha chegado ao povo. O poder político apelava ao consumismo e ao recurso ao crédito fácil.
Só mais tarde, a partir da primeira década dos anos 2000, com o desmoronar da economia europeia e o agravamento brutal do desemprego, a intervenção político-social dos bancos alimentares ganhou as honras das primeiras páginas. O plano visava pôr em prática a doutrina da Igreja como alternativa à intervenção do Estado Social. Assim, os BACF só cresceram à custa das angústias causadas nas famílias pelo brutal saque promovido pelo grande capital.
Foi um percurso extremamente contraditório: a acção social católica aceitou, em nome do combate à miséria, aliar-se àqueles que promovem a pobreza; e todo o edifício caritativo entretanto erguido, embora afirmasse o respeito pelos realizações do Estado Social, ia destruindo as suas instituições. Com intimidações e falsas promessas. Assim se percebeu que as metas a atingir seriam, pura e simplesmente, o controlo da revolta popular e a substituição da natureza do Estado.
O projecto do Banco Alimentar surgiu na área dos Jesuítas e foi nela que se estruturou. Porém, todo o aparelho assim instalado seria aparentemente autónomo e alheio a pressões e influências político-partidárias, estatais ou religiosas.
A realidade mostrou ser o oposto de tudo isto.
O Banco Alimentar contra a Fome apresenta-se à opinião pública como um espelho das virtudes cristãs. Mas como o mundo é cada vez mais pequeno, são já conhecidos detalhes das suas actividades que mostram o que se passa nos bastidores da acção: o BACF é financiado pelo Estado (1,2 milhões de euros, só em 2011 ), pelo Programa de Ajuda a Carenciados, dos fundos comunitários, pelos 80% das pensões que os pensionistas dos chamados «lares» (quase todos da Igreja) pagam como renda, por misteriosas verbas contabilizadas como «proveitos», etc. Acrescente-se, de passagem, que o BACF é uma IPSS e, como tal, não paga impostos.
Noutro sentido, os «donativos» recolhidos nunca são directamente entregues pelo banco aos mais carenciados. O BACF limita-se a distribui-los pelas IPSS ou outras instituições designadas pelos seus gabinetes técnicos (quase todos provenientes da Universidade Católica): lares, centros de dia, centros paroquiais, conferências vicentinas, etc., todos ou quase todos eles de obediência católica.
O Banco Alimentar é uma espécie de placa giratória que anima mercados e financia os cofres da caridade católica.
Fonte: Jornal Avante em www.avante.pt
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