Portugal : Garrote da dívida externa continua a aumentar

Venda a saldo de empresas portuguesas
Garrote da dívida externa continua a aumentar
por Eugénio Rosa


"Em Junho de 2014, a dívida ao estrangeiro atingia 322 176 milhões de euros, o que correspondia a 193,3% do PIB previsto para este ano. Isto significa que depois de tantos sacrifícios impostos ao País, o garrote da dívida externa não diminuiu"

Com a implosão do grupo BES, era de prever que aparecessem os «abutres» com o objetivo de comprar as melhores empresas a preços de saldo. Isso aconteceu e vai ter a ajuda deste Governo. Paulo Macedo, em declarações aos órgãos de comunicação social, já afirmou que o Governo não levantaria qualquer obstáculo à venda da Espírito Santo Saúde a um grupo mexicano, embora esta empresa tenha uma importância grande na área da saúde em Portugal, sendo mesmo responsável pela gestão do hospital público de Loures. O mesmo sucede com a seguradora Tranquilidade, objeto também da cobiça de vários grupos estrangeiros que a querem comprar por apenas 50 milhões de euros, certamente um preço de saldo.

Pela mão deste Governo já foram entregues a grupos estrangeiros o controlo de empresas estratégicas, como aconteceu com a CIMPOR, a EDP, a REN, a ANA, os CTT, a Fidelidade, o grupo de saúde HPP da CGD, e agora até a saúde, um bem público. E depois será o «Novo Banco». Tudo isto com a justificação falsa de que é bom para Portugal e para o seu desenvolvimento pois, segundo ele, atrai investimento. No entanto, «esqueceu-se» de dizer que esse investimento não cria mais riqueza, mas limita-se a apropriar-se da existente. Por isso interessa analisar os efeitos desta política de subserviência ao estrangeiro.

O Quadro 1, com dados do Banco de Portugal, mostra a dimensão do endividamento das Administrações Públicas (Estado), das empresas (públicas e privadas), dos particulares e da banca ao estrangeiro, e como ela evoluiu durante o Governo PSD/CDS.

Em Junho de 2014, a dívida das Administrações Públicas, mais a das empresas (públicas e privadas) e a dos particulares atingia 767 226 milhões de euros, o que correspondia a 4,6 vezes o valor do PIB previsto para 2014. Para além deste colossal endividamento que cresceu significativamente com o Governo PSD/CDS (entre 2010 e 2014 subiu de 414,3% do PIB para 460,4% do PIB), a gravidade é ainda maior se se tiver presente que parte importante desta dívida resulta de financiamento exterior. Entre 2010 e 2014, o financiamento estrangeiro aumentou de 168 789 milhões de euros para 223 441 milhões de euros. Se juntarmos a esta dívida ao exterior o financiamento da banca a operar em Portugal por grupos estrangeiros – 98 732 milhões de euros – conclui-se que, em Junho de 2014, a dívida ao estrangeiro atingia 322 176 milhões de euros, o que correspondia a 193,3% do PIB previsto para este ano. Isto significa que depois de tantos sacrifícios impostos ao País, o garrote da dívida externa não diminuiu. Entre 2010 e Junho de 2014, a dívida das Administrações Públicas ao exterior aumentou de 185 844 milhões de euros para 262 142 milhões de euros, o que é extremamente preocupante pois, para além de ser enorme, gera dependências que são utilizadas para justificar mais e maiores sacrifícios. 

Dependência do estrangeiro aumenta 

Como consequência da política de destruição da economia e do aumento do endividamento, a posição internacional de Portugal, traduzida na «Posição do Investimento internacional, em sentido lato», agravou-se ainda mais com a troika e com o Governo PSD/CDS de acordo com os dados do Banco de Portugal constantes do Quadro 2.

Entre 2010 e Junho de 2014, a chamada «Posição do Investimento Internacional», ou seja, a diferença entre aquilo que Portugal (os portugueses) têm no estrangeiro ou têm a haver do estrangeiro menos aquilo que os estrangeiros possuem em Portugal e têm a receber dos portugueses, agravou-se, pois passou de um saldo negativo de 185 221 milhões de euros para um saldo também negativo de 205 040 milhões de euros. Por exemplo, em Junho de 2014, o ATIVO do nosso País no estrangeiro era apenas de 280 224 milhões de euros, enquanto o PASSIVO atingia 485 264 milhões de euros. É uma diferença enorme que significa, por um lado, que muitas empresas portuguesas já pertencem a estrangeiros e, por outro lado, que o País deve cada vez mais dinheiro a estrangeiros. É esta a situação a que a troika e este Governo conduziram o País; quando forem definitivamente corridos, deixarão uma pesada herança por muitos anos.

Mas as consequências deste crescente domínio de Portugal por grupos financeiros e económicos estrangeiros não ficam por aqui. Como mostram também os dados do Banco de Portugal do Quadro 2 (ver as três colunas da direita), este domínio determina a transferência de elevados rendimentos (riqueza) produzidos em Portugal para o estrangeiro. Entre 2010 e Maio de 2014, os rendimentos transferidos para o estrangeiro somaram 70 309 milhões de euros, enquanto os recebidos do estrangeiro somaram apenas 38 278 milhões de euros. Isto significa que Portugal transferiu mais 32 031 milhões de euros para o estrangeiro do que o que recebeu, o que correspondente a 19,2% do PIB (igual ao défice orçamental de 4 anos) causado precisamente pelo domínio e dependência criada relativamente aos grupos económicos e financeiros estrangeiros. Em Portugal, o Rendimento Nacional Bruto, ou seja, a riqueza que fica anualmente no nosso País, é inferior ao PIB, ou seja, a riqueza que é produzida anualmente em Portugal, o que significa que uma parcela da riqueza produzida todos os anos pelos portugueses é transferida para os outros países, contribuindo para uma melhor vida nesses países à custa dos sacrifícios dos portugueses. Para além de tudo isto, importa ainda não esquecer que a elevada dívida externa é também utilizada pelos chamados «credores» para impor a Portugal, com a colaboração deste Governo, uma política de sacrifícios e de redução das condições de vida dos trabalhadores e reformados para assim satisfazer os interesses dos grupos econômicos credores como ficou claro nestes últimos anos.

E apesar de tudo isto ser nefasto para o País e para os portugueses, este Governo ainda tem a desfaçatez de vir dizer, através de Paulo Macedo (já antes Vítor Gaspar e todo o Governo tinham escrito o mesmo no documento de estratégia orçamental) que é bom para o País os grupos estrangeiros adquirirem, a preço de saldo, as melhores empresas portuguesas.

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