«Salvar o Euro»

«Salvar o Euro»
por João Ferreira
 
 
Estes números ajudam a confirmar (se preciso fosse ainda) os resultados desastrosos da adesão de Portugal à moeda única. Resultados que o PCP, não é demais repeti-lo, previu e para os quais preveniu.

Sabíamos já que a adesão à moeda única correspondeu em Portugal a uma década de estagnação no plano económico. No plano social, os números do desemprego ajudam a compor o retrato: entre 2001 e 2013, o número de desempregados no nosso País cresceu 147 por cento (na Zona Euro, em média, o aumento foi de 49 por cento) (i).

Segundo dados publicados na semana passada pelo Eurostat, entre 1999 e 2011, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita em Portugal caiu de 81 para 77 por cento da média da União Europeia (UE). Os dados, disponibilizados para os 27 países membros, referem-se à riqueza produzida por habitante em cada território, corrigidas as diferenças de preços registadas em cada país.

Da entrada no euro até 2011, Portugal não apenas se afastou da média da UE como, do lote de países que se encontravam abaixo da média europeia em termos de PIB per capita, foi mesmo o que mais caiu. Os gregos, que tiveram uma quebra igualmente de quatro pontos percentuais em 2011, situavam-se ainda assim nos 79 por cento, dois pontos percentuais acima de Portugal.

Um outro indicador, o do consumo per capita – que traduz de alguma forma o nível de bem-estar dos agregados familiares – também evidencia uma quebra de 84 para 81 por cento da média da UE, entre 1999 e 2011.

Estes números ajudam a confirmar (se preciso fosse ainda) os resultados desastrosos da adesão de Portugal à moeda única. Resultados que o PCP, não é demais repeti-lo, previu e para os quais preveniu.

Mas estes números confirmam também a mentira da Europa da solidariedade e da coesão, desvendando, pelo contrário, a verdade nua e crua da Europa da divergência. Os países que em 1999 tinham um PIB per capita acima da média da UE são os mesmos que em 2011 se encontram também acima da média da UE. Mas a diferença entre o topo da lista (ocupado pelo Luxemburgo) e o fundo da tabela (onde está a Bulgária) aumentou, passando de 221 para 225 pontos percentuais.


Uma curiosidade: dos países não membros da Zona Euro, com excepção da Dinamarca e do Reino Unido, todos os outros aumentaram o seu PIB per capita face à média da UE; já entre os países da Zona Euro, foram sete os que tiveram uma evolução negativa – Áustria, Bélgica, Finlândia, França, Itália, Grécia e Portugal. Números que nos trazem inevitavelmente à memória as promessas, feitas no final do século passado, de que o euro seria «um escudo contra a crise».



Moeda do capital


Ainda em jeito de balanço, os números agora divulgados pelo Eurostat vêm complementar números e previsões disponibilizados pela Comissão Europeia, que evidenciam a quem serviu o euro (denotando, assim, a sua natureza de classe). Entre 2001 e 2013, em termos médios, os lucros crescerão cinco vezes mais do que os salários na Zona Euro. Em Portugal, a diferença acentua-se: os lucros crescerão 26 vezes mais do que os salários.

À luz deste imprescindível balanço, ganham um sentido mais claro os insistentes apelos para se «salvar o euro», completando para tal o «edifício da moeda única», reforçando e aprofundando a União Económica e Monetária (UEM). O mal, dizem-nos agora, não foi o que se fez, mas o que ficou por fazer.

Estes salvíficos apelos, partindo de quadrantes diversos, da direita à social-democracia, incluindo a auto-denominada «esquerda europeísta», servem, afinal de contas, os mesmos interesses. O que talvez ajude a explicar as votações ocorridas na sessão plenária de Novembro do Parlamento Europeu.

Votava-se então um relatório sobre o aprofundamento da UEM. Uma emenda ao relatório, apresentada pelos deputados do PCP e subscrita por outros deputados do Grupo da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica, propunha substituir o texto «considera necessário colocar a governação da UEM no quadro institucional da União, o que é uma condição prévia para a sua eficácia e para colmatar o hiato político atual entre as políticas nacionais e as políticas europeias» por um outro, de sentido inverso e clarificador: «considera importante salvaguardar a democracia e assegurar a participação efectiva dos cidadãos, o que pressupõe a defesa da soberania nacional e o exercício pleno, por parte das instituições nacionais, do papel que lhes incumbe, em vez da sua desvalorização ou da transferência das suas competências para as instituições supranacionais da UE, nomeadamente, através de um reforço do direito que assiste aos parlamentos nacionais de decidirem sobre as políticas da UE».

O resultado da votação foi o seguinte: a favor – PCP; contra – PS, PSD, CDS; abstenção: BE. Elucidativo.

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(i) Pedro Carvalho, “Derrotar a UE para construir o futuro”, revista “Portugal e a UE” n.º 63 (Nov. 2012)

 
 
Fonte: Jornal Avante em www.avante.pt
 
 
 
 

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