A rosa radioativa : Hiroxima nunca mais!

Nos 69 anos do lançamento das bombas atómicas
– Hiroxima nunca mais!
por Gustavo Carneiro


"Muito se disse e se escreveu sobre os bombardeamentos nucleares de Hiroxima e Nagasáqui. A versão «oficial», difundida pela poderosa máquina de propaganda dos Estados Unidos da América, justifica o recurso à bomba atómica com a necessidade de forçar a rendição japonesa e, dessa forma, evitar «centenas de milhares de mortes» norte-americanas. Trata-se, porém, de uma tese que não resiste à mais leve confrontação e que passa por cima de uma questão essencial: será tudo admissível, mesmo em tempo de guerra?

A resposta a esta questão, que devia ser evidente, deu-a o físico de origem húngara Leo Szilard, um dos «pais» da bomba atómica norte-americana e tenaz opositor ao bombardeamento de Hiroxima e Nagasáqui: dizia ele que se tivessem sido os alemães a utilizar estas armas sobre cidades, tal teria sido considerado um crime de guerra e os seus responsáveis teriam sido condenados à morte no Tribunal de Nuremberga."


Em Agosto de 1945, pela primeira vez na História (e, até ao momento, única), foram utilizadas bombas atómicas num conflito militar. Em Hiroxima e Nagasáqui, centenas de milhares de pessoas, civis na sua imensa maioria, foram exterminadas pela mais potente arma alguma vez construída e experimentada: umas nos segundos que se seguiram às explosões; outras nos dias, meses e anos seguintes, vítimas da radiação.

Os que escaparam à morte viveram vidas de sofrimento, marcadas pelas permanentes doenças e dramáticas memórias. Eram – e são ainda! – os «hibakushas», os sobreviventes. É sobre eles o poema de 1954 de Vinicius de Moraes, «Rosa de Hiroshima», imortalizado pelos Secos & Molhados e pelo seu mais conhecido elemento, Ney Matrogrosso: «Pensem nas crianças/ Mudas telepáticas./ Pensem nas meninas/ Cegas inexatas./ Pensem nas mulheres/ Rotas alteradas./ Pensem nas feridas/ Como rosas cálidas./ Mas, oh, não se esqueçam/ Da rosa da rosa./ Da rosa de Hiroshima/ A rosa hereditária./ A rosa radioativa/ Estúpida e inválida./ A rosa com cirrose/ A anti-rosa atômica./ Sem cor sem perfume/ Sem rosa sem nada.»

Também os poucos edifícios que ficaram de pé nas duas cidades japonesas permanecem como testemunhos do crime – para que não se repita! É o caso da «Cúpula Genbaku», no coração de Hiroxima, classificado como «Património Mundial» pela UNESCO em 1996. Funciona hoje como Memorial da Paz daquela cidade japonesa. 

Mitos e realidades 

Muito se disse e se escreveu sobre os bombardeamentos nucleares de Hiroxima e Nagasáqui. A versão «oficial», difundida pela poderosa máquina de propaganda dos Estados Unidos da América, justifica o recurso à bomba atómica com a necessidade de forçar a rendição japonesa e, dessa forma, evitar «centenas de milhares de mortes» norte-americanas. Trata-se, porém, de uma tese que não resiste à mais leve confrontação e que passa por cima de uma questão essencial: será tudo admissível, mesmo em tempo de guerra?

A resposta a esta questão, que devia ser evidente, deu-a o físico de origem húngara Leo Szilard, um dos «pais» da bomba atómica norte-americana e tenaz opositor ao bombardeamento de Hiroxima e Nagasáqui: dizia ele que se tivessem sido os alemães a utilizar estas armas sobre cidades, tal teria sido considerado um crime de guerra e os seus responsáveis teriam sido condenados à morte no Tribunal de Nuremberga.

Mesmo ignorando esta questão fundamental, nada – do ponto de vista meramente militar – justifica a utilização destas bombas sobre as cidades japonesas. Em primeiro lugar, porque Hiroxima e Nagasáqui não tinham um evidente interesse militar, sendo a sua população quase exclusivamente civil. O próprio Eisenhower, mais tarde presidente dos EUA, e o general Douglas McArthur (que defendeu a utilização da bomba atómica mais tarde, sobre a URSS, a China e a Coreia) negaram por diversas vezes a «necessidade militar» dos bombardeamentos.

Se o efeito militar era «discutível», as consequências políticas destes bombardeamentos eram mais ambiciosas, visando mais do que o Japão (cuja rendição a curto prazo era inevitável) a União Soviética e o irreprimível movimento de libertação nacional e social que então se vivia na Europa e também na Ásia. Não será certamente um acaso o facto de os EUA terem recorrido à arma atómica no preciso momento em que a União Soviética tinha já entrado em guerra com o Japão. E com assinaláveis sucessos, diga-se.

Mas é sobretudo a acção dos EUA no pós-guerra que comprova a ideia de que o bombardeamento atómico de Hiroxima e Nagasáqui foi, mais do que um dos últimos actos da Segunda Guerra Mundial, a primeira grande acção da chamada «Guerra Fria». 

Derrotar o imperialismo 

Nos anos que se seguiram ao final do maior conflito militar da história da Humanidade, que ceifou a vida a 50 milhões de pessoas, a política externa dos EUA foi particularmente agressiva, norteada pelo objectivo de domínio planetário. No seu caminho estavam, então, a União Soviética, os países que se libertavam do imperialismo e a luta dos povos pela paz, o progresso e a soberania.

O cerco militar em redor da Europa e da Ásia (no que então foi designado como um «anel de fogo» em torno da URSS), a sujeição económica dos países da Europa Ocidental através do Plano Marshall, a intervenção militar na Grécia e a guerra da Coreia comprovam a natureza predadora da política do imperialismo norte-americano. O seu principal trunfo – mantido até ao início da década de 50 – era o monopólio nuclear.

Tal como nesses anos, em que a luta dos povos pela paz travou os ímpetos mais agressivos do imperialismo, também hoje há que intensificar o combate pela paz, em defesa da soberania de países e povos: a ingerência dos EUA e da UE na Ucrânia e a constante provocação à Rússia, o cerco militar a este país e à China, o apoio incondicional a Israel na sua sanha contra o povo da Palestina, o desenvolvimento de novas e mais poderosas armas e a admissão explícita de utilização de armas nucleares num primeiro ataque mostra que o imperialismo está disposto a tudo. Cabe aos comunistas, aos progressistas e aos povos do Mundo derrotá-lo!





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