Brasil Imperialista ou Não?
Brasil Imperialista ou Não?
PC Grego X PCB e outros...
O assunto está longe de ser resolvido ou mesmo sintetizado – embora cause aflição na mente que intuitivamente prevê as implicações gravíssimas a que leva para as estratégias e táticas que se contentam em ser “anti-imperialistas e anticapitalistas” em uso, nos moldes da tentativa de manter obter consenso mas que não mais se sustenta.
A leitura e retomada de Lênin e dos clássicos da teoria marxista do imperialismo é o be-a-bá para se abordar a questão; mas repetir seus enunciados não resolve o problema – apenas se mostrando como simplista, esse simplismo das abordagens não são somente fortuitos, involuntários, fruto do despreparo ou da negligência, ao contrário, têm seu porque. Sabemos e é fácil saber – como veremos adiante.
A questão não pode ser resolvida com a constatação de que estamos num mundo imperialista. Hoje a questão já se complexificou muito mais, e não devido a um desenvolvimento teórico, mas pelo desenvolvimento das forças produtivas capitalistas ao longo do XX e no início do XXI. A mesma dialética que fez com que Lênin pusesse suas lentes sobre o imperialismo, o qual emergiu como fase do capital no final do XIX e era um problema concreto para a revolução proletária internacional, do mesmo modo hoje o marxismo revolucionário está diante do inédito desenvolvimento dessa fase que coloca novas questões e aprofunda as antigas. O KKE a nosso ver está focado nessas questões, no que tem de mais complexo e influente para a práxis revolucionária – diferentemente de quem dá como resolvida a questão simplesmente por negar sua existência ou relevância, remetendo tudo de volta a Lênin.
Claro, concordando com a importância da abertura do KKE para a questão, vamos prosseguir a aprofundando a sua constatação de que o Brasil é imperialista, constitui um “centro imperialista”, assim como os “emergentes”.
A partir dos termos colocados pelo KKE, a questão não é nem simples, nem óbvia e sequer resolvida. Sendo a formulação do KKE a que está na fronteira, smj, é dela que vamos tratar e continuar tratando, inclusive nos desdobramentos e conexões que têm com as estratégias políticas.
Adianto que minha conclusão preliminar nesse ponto da reflexão é que o KKE está em movimento nas suas formulações, mas intimamente comprometido com as questões no nível mais elevado em que estão se apresentando.
Inúmeros problemas para serem desdobrados e analisados nessa citação, exatamente aquela em que o KKE propõe uma “Frente Democrática” – um resumo, mas bem feito e exato no seu essencial. Mesmo salientando o resguardo da independência do partido, aqui está a sua vinculação à estratégia democrático popular e a profunda contradição com a sua descriminação de que a próxima revolução será socialista. No Brasil encontramos, como é fácil documentar inclusive aqui mesmo na ESK, as várias versões da estratégia democrática popular.
Sabemos que o PCB está num esforço, principalmente desde seu último Congresso, de superação da estratégia democrática popular. O resultado que estamos vendo nos casos do KKE e do PCB, aqui talvez com menos intensidade, é que a estratégia democrático popular apenas veio mais à esquerda – mas ainda vige, e muito forte e bem estabelecida, em termos essenciais. Há outros textos do KKE por que passei nessa investigação que expõe com mais desdobramentos essa estratégia de Frente anti-imperialista e anticapitalista.
E - Ainda no mesmo texto, Papariga sobre "desenvolvimento desigual", "sistema imperialista" e "países imperialistas":
"Desenvolvimento desigual quer dizer desenvolvimento político e social desigual, o que significa que as condições prévias para o início da situação revolucionária podem emergir mais cedo num país ou num grupo de países que, sob condições específicas, pode constituir o “elo mais fraco” do sistema imperialista. Isto é particularmente importante hoje em dia, em que o desenvolvimento e as remodelações têm lugar no sistema imperialista e se intensificam as contradições tanto nos países como no sistema imperialista. Portanto, entendemos que cada partido comunista e que os trabalhadores de cada país têm o dever internacionalista de contribuir para a luta de classes ao nível internacional, mobilizando e organizando a luta contra as consequências das crises nacionais, com vista ao derrube do poder burguês, à conquista do poder pelos trabalhadores e à construção do socialismo." (mesmo link)
F - Ao falar sobre a natureza "socialista" da próxima revolução na Grécia, o KKE coloca sua posição em termos internacionais:
"Independentemente do tamanho do país e da sua posição no sistema imperialista internacional, independentemente do continente a que pertence, consideramos que na nova sociedade as relações socialistas que resultam da constituição de um estado revolucionário em que os trabalhadores detêm o poder têm características comuns.
Não concordamos com a ideia da existência de diferentes “modelos” de socialismo nem com as “peculiaridades nacionais” que negam as leis. A realidade de cada sociedade, o tamanho da população rural, o nível dos meios de produção, por exemplo, não negam os princípios e as tendências gerais."
Problemas vários neste ponto, mas aí está o posicionamento do KKE! Cremos que esse posicionamento sugere uma possível hipótese. O KKE está em movimento. De uma posição principista, o que é avesso ao materialismo de Marx, Engels e Lênin, o KKE procura respaldar o porque a revolução é socialista nos seus princípios e na sua materialidade histórica – não só alegando uma “tendência geral”. O KKE estaria colocando a questão dos novos centros imperialistas emergentes para embasar teórica e historicamente uma posição de princípio. Isso iremos ver no decorrer de novas análises.
G - Agora passamos à culminância e a dramática contradição da estratégia essencialmente democrático popular. O KKE, assim como outros partidos da vertente estalinista, como o PCB inclusive, estão num esforço de superar a estratégia democrático popular. A estratégia democrático popular é uma impossibilidade nos próprios termos – mesmo para o KKE que a meu ver é a concepção de fronteira no campo dessa estratégia:
"Outra questão crucial é a de se formar uma opinião unitária sobre uma questão fundamental: se as novas relações socialistas podem resultar de reformas, sem o derrube da burguesia e dos seus órgãos".
Embora já tenha sido tratada, na teoria e na prática, esta questão ressurgiu como forma de pressão em partidos declaradamente marxistas-leninistas. É uma questão estratégica fundamental para o movimento comunista.
Na nossa opinião, a acção da classe trabalhadora e das massas populares num período revolucionário implica o confronto com todas as estruturas burguesas, o seu derrube e a formação de novos órgãos de poder popular.
Só assim a burguesia perderá o poder político através do qual domina, só assim venceremos a sua resistência, pois nunca abdicou do poder voluntariamente. O conceito da revolução socialista não se restringe ao derrube do poder burguês, abrange todo o período de consolidação e predomínio das relações comunistas, até à completa erradicação das classes sociais.
Uma das mais importantes conclusões sobre o carácter da sociedade socialista é a de que esta é uma forma subdesenvolvida, como que um estágio inicial da sociedade comunista.
Vimos que, embora Marx, Engels e Lénine tivessem uma posição clara sobre o carácter teórico do socialismo, na prática, esta posição foi interpretada de forma a sugerir a existência de sociedades distintas, cujo desenvolvimento conduziria ao comunismo.
Independentemente das intenções, esta divisão arbitrária da sociedade comunista em sociedades socialista e comunista constituiu a base para o fortalecimento de pontos de vista oportunistas, tanto no campo das relações de produção socialista, como no campo da super estrutura. Minou o carácter da ditadura do proletariado, do planeamento de âmbito nacional e do carácter do Partido Comunista, como vanguarda político-ideológica da classe operária, durante a consolidação e o desenvolvimento da nova sociedade. Minou o carácter do planeamento central e, finalmente, levou ao enfraquecimento das relações de produção socialista, em vez de as reforçar. Nesta base, podemos explicar o fortalecimento das forças contra-revolucionárias na super estrutura política.
O nosso partido acredita que, segundo a teoria marxista-leninista, o socialismo é o comunismo imaturo, que é o estádio inferior da sociedade comunista, ou seja, o comunismo que está apenas chegando das entranhas do capitalismo e tem que se basear nos fundamentos económico-técnicos herdados do capitalismo.
No entanto, as principais leis da sociedade comunista são válidas no socialismo: a socialização dos meios de produção concentrada, a reprodução ampliada visando a satisfação das necessidades sociais, o planeamento central, o controlo operário e, até certo ponto, a distribuição de acordo com as necessidades (educação e saúde, por exemplo). Devido ao carácter muito imaturo do socialismo, uma parte do produto social (o destinado ao consumo individual) é distribuído de acordo com o princípio “a cada um segundo o seu trabalho”.”(mesmo link)
Vemos o KKE se posicionar na extrema esquerda do vasto campo estalinista.
Vamos comentar um dos aspectos que esse trecho do posicionamento do KKE traz e que tem relação com o nosso assunto âncora – a natureza imperialista do Brasil. Trata-se da estratégia da transição do comunismo inferior (socialismo) para o comunismo superior.
O período de transição para Marx, Engels e Lênin, principalmente este, é a ditadura do proletariado. Há uma discussão se todo o período da transição precisa ser necessariamente uma ditadura do proletariado. Porém não há discussão de que exatamente o INÍCIO da transição será obrigatoriamente um período de ditadura do proletariado. Oras, a ditadura do proletariado não pode de modo algum ser aproximada, diluída, indiferenciada em outros tipos de ditaduras que têm outro tipo de base social, como a “ditadura democrática do proletariado e do campesinato” no caso da Rússia, ou quaisquer outras ditaduras que tenham esta ou mais classes como sustentáculo, tais como “pequenos empresários”, classes médias rurais e urbanas etc...
Os camaradas do KKE parecem recair num erro teórico fundamental e básico que é do b-a-bá do marxismo proletário. A ditadura do proletariado cabe ao proletariado somente, à sua classe e de nenhuma forma a outra classe. Trata-se de uma ditadura de classe. Isso não quer dizer que outras classes não possam vir em apoio ao proletariado e seu programa revolucionário – mas a ditadura de classe não é a sua ditadura como classe que apoia e sim a ditadura do proletariado. No período de transição não se trata, por definição, de uma frente que tem um programa próprio específico, uma condução própria que por ser própria é necessariamente diferente daquela do proletariado. Trata-se então do proletariado no poder do estado revolucionário, seu estado de classe – mais nenhuma classe figura no poder proletário.
Lênin disse que algumas medidas da ditadura democrática do proletariado e do campesinato poderiam ser e de fato foram medidas socialistas, principalmente quando se tratasse da economia urbano-industrial totalmente sob controle do proletariado urbano com o seu operariado industrial. Mas não havia ilusões da parte dele a respeito da natureza histórica da ditadura que estava no poder. Não raro Lênin e Trotsky falaram em vigência da ditadura do proletariado no período que vai desde da tomada do poder até o início da contrarrevolução em 1923/4. Isso se deveu, nesse período, mais às circunstâncias da guerra civil do que à dinâmica econômica. O período de guerra civil de um certo modo reforçou o poder proletário –mas foi conjuntural, como vimos depois na NEP.
A ditadura do proletariado nunca chegou a ser essencialmente e plena na economia de toda a nação russa na acepção estridente do termo, como o seria, p.ex., na Alemanha e outros países desenvolvidos da época caso a revolução proletária vencesse. Mesmo o planejamento era uma necessidade e uma luta, mas foi pouco uma realidade nesse período – os escritos de Lênin a respeito são abundantes. O “Comunismo de Guerra” foi um fortíssimo expediente que ilustra algumas medidas próprias da ditadura do proletariado, mas não foi de modo algum a realização orgânica da transição ao comunismo. Tratava-se a rigor de uma economia de guerra conduzida, aliás com pleno êxito, pelo poder político do proletariado, pelo estado proletário, portanto, trata-se de um magnífico exemplo. O período da Guerra Civil foi um período em que o poder proletário foi exercido na sua plenitude inclusive sobre as correntes da esquerda russa mais ligadas às bases camponesas que se voltaram contra os bolcheviques. Não só sobre correntes com base no campesinato, mas também sobre algumas com base no proletariado urbano, como foi o caso de Cronstadt, os anarquistas etc. Tratou-se, nesse contexto específico, da ditadura do proletariado ou democracia proletária, o seu exato sinônimo.
O POSDR-bolchevique (1912) era não só um partido comunista devido ao seu programa, nem um partido “dos trabalhadores”, um partido que se baseava no marxismo revolucionário, mas era um partido comunista essencialmente e formalmente operário. Era portanto um partido operário comunista. Era operário não só porque representava os interesses históricos ou imediatos do operariado, e nem porque tinha influência sólida no operariado ou porque organizava o operariado segundo concepções e objetivos revolucionários, mas porque era tudo isso sendo fundamentalmente formado por operários comunistas do setor industrial de ponta. Lênin tem várias estatísticas e uma visão clara dos quadros componentes do partido nos seus vários momentos desde 1898, até inclusive no último quando escreve “Melhor poucos mas bons”. Em todas as fases de desenvolvimento do POSDR Lênin sempre teve essa preocupação com o caráter operário e as bases operárias nas bases e nos cargos do partido.
Então a questão: como passar do que poderíamos chamar de “ditadura popular” ou “multiclassista”, que compreende uma coalizão de forças sociais que vão desde o operariado, o proletariado em geral, a pequena burguesia, os pequenos empresários etc... que embasaria o socialismo e o novo estado socialista, para o Comunismo superior como quer a concepção de transição do KKE?
A resposta a essa pergunta, claro, não é nem pode ser instrumental – mas envolve uma profunda questão teórica e de princípios na qual estão profundamente mergulhados hoje todos os comunistas sinceros, como é sem dúvida o caso do PCB, do KKE e outros.
Voltemos à análise de um posicionamento do KKE que já abordamos mas que parece, à primeira vista, genérico demais e principista, ou seja idealista. Trata-se da caracterização da revolução como socialista para todos os lugares. Mas parece que é exatamente essa insuficiência flagrante que o KKE está procurando sanar, quando abre a questão do imperialismo na nova configuração do mercado mundial. O imperialismo na sua configuração atual, e não a passada, parece ser o elemento histórico e material que dá à tese de que a revolução é imediatamente socialista algo a mais do que a razão dos “princípios” e das “tendências gerais”.
As questões que se desdobram a partir desta caracterização dos países emergentes como imperialistas são inúmeras e não estão ligadas somente a existência ou não de uma aristocracia operária, mas também àquela que é crucial: a das modernas classes médias assalariadas! Embora o KKE fale em “pequenos empresários” e etc na sua exposição do arco de alianças, a questão, da qual ele não fala, pelo menos nos textos analisados, é a do fenômeno massivo inerente das economias imperialistas: as modernas classes médias assalariadas!
Se a burguesia é burguesa, imperialista ou pró-imperialista, para países como Brasil, a questão parece ter sido devidamente respondida ou resolvida e superada pelo desenvolvimento das forças produtivas do capital no Século XX.
Então seria como “falar de corda em casa de enforcado” dizer que a burguesia é enfim burguesa e imperialista – já não é mais uma questão significativa para o campo do marxismo revolucionário. Porém, e a respeito das classes médias orgânicas de uma economia imperialista? O abuso no uso dos termos “povo” (abuso que o KKE não faz, porque enumera precisamente o que considera por povo) e “trabalhadores” mascara e simplifica insuportavelmente as questões e dilemas reais das esquerdas revolucionárias hoje. Forjam artificialmente, neste simplismo, um campo consensual muito propício exatamente à estratégia política que elegem – a da frente multiclassista, que alguns querem aclassista, ou seja: quando o KKE quer que essa frente multiclassista seja a base do socialismo, ou seja da transição para o comunismo, quer que esse amálgama seja responsável por uma tarefa que é única e exclusivamente do proletariado revolucionário.
Voltaremos.
Mis besos,
Texto Originalmente postado na lista internacional de discussão ESKUERRA!
http://br.groups.yahoo.com/group/eskuerra/message/63884
** ESK - Lista de discussão da esquerda na internet.
PC Grego X PCB e outros...
Por: Ivan 1871
Não é nada simples esse assunto – nem na sua caracterização e muito menos nos seus desdobramentos.
Não é nada simples esse assunto – nem na sua caracterização e muito menos nos seus desdobramentos.
O assunto está longe de ser resolvido ou mesmo sintetizado – embora cause aflição na mente que intuitivamente prevê as implicações gravíssimas a que leva para as estratégias e táticas que se contentam em ser “anti-imperialistas e anticapitalistas” em uso, nos moldes da tentativa de manter obter consenso mas que não mais se sustenta.
A leitura e retomada de Lênin e dos clássicos da teoria marxista do imperialismo é o be-a-bá para se abordar a questão; mas repetir seus enunciados não resolve o problema – apenas se mostrando como simplista, esse simplismo das abordagens não são somente fortuitos, involuntários, fruto do despreparo ou da negligência, ao contrário, têm seu porque. Sabemos e é fácil saber – como veremos adiante.
A questão não pode ser resolvida com a constatação de que estamos num mundo imperialista. Hoje a questão já se complexificou muito mais, e não devido a um desenvolvimento teórico, mas pelo desenvolvimento das forças produtivas capitalistas ao longo do XX e no início do XXI. A mesma dialética que fez com que Lênin pusesse suas lentes sobre o imperialismo, o qual emergiu como fase do capital no final do XIX e era um problema concreto para a revolução proletária internacional, do mesmo modo hoje o marxismo revolucionário está diante do inédito desenvolvimento dessa fase que coloca novas questões e aprofunda as antigas. O KKE a nosso ver está focado nessas questões, no que tem de mais complexo e influente para a práxis revolucionária – diferentemente de quem dá como resolvida a questão simplesmente por negar sua existência ou relevância, remetendo tudo de volta a Lênin.
Claro, concordando com a importância da abertura do KKE para a questão, vamos prosseguir a aprofundando a sua constatação de que o Brasil é imperialista, constitui um “centro imperialista”, assim como os “emergentes”.
A partir dos termos colocados pelo KKE, a questão não é nem simples, nem óbvia e sequer resolvida. Sendo a formulação do KKE a que está na fronteira, smj, é dela que vamos tratar e continuar tratando, inclusive nos desdobramentos e conexões que têm com as estratégias políticas.
Adianto que minha conclusão preliminar nesse ponto da reflexão é que o KKE está em movimento nas suas formulações, mas intimamente comprometido com as questões no nível mais elevado em que estão se apresentando.
Nas recentes formulações com que tive contato no marxismo brasileiro em geral, e do marxismo revolucionário em particular, nenhuma chegou a esse nível de clareza e de explicitação da complexidade e do dilema colocado pelo desenvolvimento do MPC nesse início de século. O KKE felizmente chega. Isso é interessante porque nos dá a interlocução no nível que é necessário para fazer a discussão e a elaboração andar.
Continuemos então.
Com efeito, a posição do KKE com relação à natureza imperialista dos emergentes vem maturando a algum tempo e fazendo o partido se demarcar fortemente no interior do campo dos demais PCs e correntes estalinistas, neo-estalinistas e pós-estalinistas – já salientamos a posição específica do KKE no estalinismo a algum tempo aqui na ESK em inúmeras oportunidades. Agora o KKE novamente faz prova da sua vocação à vanguarda na tradição estalinista e para as esquerdas revolucionárias como um todo.
Importante frisar que no seu percurso dialético inevitável o estalinismo não está sozinho.
Aqui a dialética que encontramos ao analisar o estalinismo como vertente do marxismo é a mesma que encontramos quando tratamos do paradigma lukacsiano (Lukacs ele mesmo, correntes lukacsianas, neolukacsianas, pós-lukacsianas). A ideia fundamental é que nesse movimento de progressão histórica, o paradigma se mantem, mesmo gerando dentro de si o seu contraditório. O sucesso definitivo da última revolução proletária internacional, que se esgota em 1923/4, teria superado todas essas configurações paradigmáticas rápida e definitivamente. O problema é que o mundo enveredou na contrarrevolução que dura até hoje e por mais alguns anos adiante.
Nesse sentido, a contrarrevolução apresentou-se como um percurso à frente a ser trilhado e vivido pelas as correntes do marxismo revolucionário, dando assim ensejo a uma progressão dialética para cada uma das vertentes.
O paradigma quando não se dilui, vai subsistindo através de adaptações que se dão como luta ideológica, teórica e política no seu interior. O fato é que enquanto o contraditório interior ao paradigma permanecer, ele em si não será superado, se mantem procurando readequar-se ao tempo, circunstâncias, aos diferentes momentos e exigências desta época de contrarrevolução.
Estes paradigmas todos persistem porque têm uma raiz social, uma natureza de classe que os explica e ao mesmo tempo os sustenta como forma fenomênica e como uma de suas expressões.
A corrente que se localiza numa das vertentes do paradigma define-se, então, a partir da filiação teórico-histórica a esse campo paradigmático seja ele o lukacsiano, o gramsciniano, o estalinista, o trotskysta, o conselhista, o bordiguista, o leninista etc, cada uma com suas especificidades. Isso é importante para compreendermos o KKE, sua natureza e seus limites atuais.
Importante lembrar que sequer o marxismo revolucionário específico que trilhamos se exime de ser tratado dessa forma, com essa abordagem, pois tem em si a mesma dialética.
Continuemos então.
Com efeito, a posição do KKE com relação à natureza imperialista dos emergentes vem maturando a algum tempo e fazendo o partido se demarcar fortemente no interior do campo dos demais PCs e correntes estalinistas, neo-estalinistas e pós-estalinistas – já salientamos a posição específica do KKE no estalinismo a algum tempo aqui na ESK em inúmeras oportunidades. Agora o KKE novamente faz prova da sua vocação à vanguarda na tradição estalinista e para as esquerdas revolucionárias como um todo.
Importante frisar que no seu percurso dialético inevitável o estalinismo não está sozinho.
Aqui a dialética que encontramos ao analisar o estalinismo como vertente do marxismo é a mesma que encontramos quando tratamos do paradigma lukacsiano (Lukacs ele mesmo, correntes lukacsianas, neolukacsianas, pós-lukacsianas). A ideia fundamental é que nesse movimento de progressão histórica, o paradigma se mantem, mesmo gerando dentro de si o seu contraditório. O sucesso definitivo da última revolução proletária internacional, que se esgota em 1923/4, teria superado todas essas configurações paradigmáticas rápida e definitivamente. O problema é que o mundo enveredou na contrarrevolução que dura até hoje e por mais alguns anos adiante.
Nesse sentido, a contrarrevolução apresentou-se como um percurso à frente a ser trilhado e vivido pelas as correntes do marxismo revolucionário, dando assim ensejo a uma progressão dialética para cada uma das vertentes.
O paradigma quando não se dilui, vai subsistindo através de adaptações que se dão como luta ideológica, teórica e política no seu interior. O fato é que enquanto o contraditório interior ao paradigma permanecer, ele em si não será superado, se mantem procurando readequar-se ao tempo, circunstâncias, aos diferentes momentos e exigências desta época de contrarrevolução.
Estes paradigmas todos persistem porque têm uma raiz social, uma natureza de classe que os explica e ao mesmo tempo os sustenta como forma fenomênica e como uma de suas expressões.
A corrente que se localiza numa das vertentes do paradigma define-se, então, a partir da filiação teórico-histórica a esse campo paradigmático seja ele o lukacsiano, o gramsciniano, o estalinista, o trotskysta, o conselhista, o bordiguista, o leninista etc, cada uma com suas especificidades. Isso é importante para compreendermos o KKE, sua natureza e seus limites atuais.
Importante lembrar que sequer o marxismo revolucionário específico que trilhamos se exime de ser tratado dessa forma, com essa abordagem, pois tem em si a mesma dialética.
Não nos interessa, para esta reflexão, o marxismo reformista e nem o populista.
Aproveitando então as referências a respeito da questão do Imperialismo que nos foram indicadas em mensagem anterior aqui na ESK, encontrei algumas citações esparsas bastante claras sobre do movimento recente do KKE para caracterizar os BRICS ou os "emergentes" como novos CENTROS imperialistas! Assim, interessa ver como o KKE vê precisamente a questão do imperialismo e como ele aplica isso à sua estratégia política nacional, europeia e internacional.
Vejamos Papariga no 16.º Congresso da Federação Sindicalista Mundial (FSM).
A – aqui sobre a crise, surgem alguns elementos novos, dentre eles a emergência dos novos centros imperialistas:
"O que hoje é óbvio e constitui um elemento relativamente novo é que o sistema capitalista, à escala nacional, regional e internacional, tem um campo de manobra muito limitado na gestão da crise, em comparação com o passado, devido à competição, à maior anarquia nas condições de liberalização dos movimentos de capitais, ao incremento do número dos centros imperialistas que lutam pela (re)divisão dos mercados, etc."
http://mafarricovermelho.blogspot.com/2011/04/aleka-papariga-nenhuma-versao.html
B - En passant, é interessante ver o claríssimo posicionamento do KKE, a respeito das guerras imperialistas, particularmente das recentes:
"Nós dissemos NÃO, desde o início, à guerra imperialista nos Balcãs, no Médio Oriente, na
África, na Ásia, independentemente do nosso desacordo com os regimes e governos de cada país. O Não à guerra no Iraque não significava tolerância com Saddam, nem o Não à guerra na Líbia tem alguma coisa a ver com tolerância ou apoio a Kadhafi." (mesmo link)
C - Seguindo com os posicionamentos do KKE a respeito de uma demarcação geral para a política de alianças:
"Somos de opinião de que o mais amplo esclarecimento dos povos deve ser desenvolvido de forma mais aberta e audaz, juntamente com ações práticas, para fortalecer a posição política de que nenhum povo deve perfilar-se ao lado da classe burguesa do seu país na competição interimperialista, na sua tentativa de conseguir uma parte da pilhagem derivada da exploração de classe e da opressão imperialista." (mesmo link)
Então já temos elementos importantes nessa comunicação datada do KKE:
Aproveitando então as referências a respeito da questão do Imperialismo que nos foram indicadas em mensagem anterior aqui na ESK, encontrei algumas citações esparsas bastante claras sobre do movimento recente do KKE para caracterizar os BRICS ou os "emergentes" como novos CENTROS imperialistas! Assim, interessa ver como o KKE vê precisamente a questão do imperialismo e como ele aplica isso à sua estratégia política nacional, europeia e internacional.
Vejamos Papariga no 16.º Congresso da Federação Sindicalista Mundial (FSM).
A – aqui sobre a crise, surgem alguns elementos novos, dentre eles a emergência dos novos centros imperialistas:
"O que hoje é óbvio e constitui um elemento relativamente novo é que o sistema capitalista, à escala nacional, regional e internacional, tem um campo de manobra muito limitado na gestão da crise, em comparação com o passado, devido à competição, à maior anarquia nas condições de liberalização dos movimentos de capitais, ao incremento do número dos centros imperialistas que lutam pela (re)divisão dos mercados, etc."
http://mafarricovermelho.blogspot.com/2011/04/aleka-papariga-nenhuma-versao.html
B - En passant, é interessante ver o claríssimo posicionamento do KKE, a respeito das guerras imperialistas, particularmente das recentes:
"Nós dissemos NÃO, desde o início, à guerra imperialista nos Balcãs, no Médio Oriente, na
África, na Ásia, independentemente do nosso desacordo com os regimes e governos de cada país. O Não à guerra no Iraque não significava tolerância com Saddam, nem o Não à guerra na Líbia tem alguma coisa a ver com tolerância ou apoio a Kadhafi." (mesmo link)
C - Seguindo com os posicionamentos do KKE a respeito de uma demarcação geral para a política de alianças:
"Somos de opinião de que o mais amplo esclarecimento dos povos deve ser desenvolvido de forma mais aberta e audaz, juntamente com ações práticas, para fortalecer a posição política de que nenhum povo deve perfilar-se ao lado da classe burguesa do seu país na competição interimperialista, na sua tentativa de conseguir uma parte da pilhagem derivada da exploração de classe e da opressão imperialista." (mesmo link)
Então já temos elementos importantes nessa comunicação datada do KKE:
a) emergência de outros "centros imperialistas", que posteriormente serão explicitados como sendo os BRICS ou mais genericamente os chamados "países emergentes", inclusive o Brasil.
b) nenhum "povo" pode perfilar-se ao lado da classe burguesa de seu país na competição interimperialista, e isto então vale para os países que constituem os novos "centros" imperialistas, Brasil inclusive.
D- Em outro posicionamento recente de Papariga temos a proposta política do "PCG", ou PC Grego ou simplesmente KKE (tenho que tomar cuidado extremo com os nomes e siglas... para não esquecer jamais o puxão de orelhas, fraterno claro, do meu querido camarada Edmilson, rs):
"O PCG defende a criação de uma Frente Democrática, anti-imperialista e antimonopolista, uma aliança entre trabalhadores (independentes e por conta de outrem) e pequenos e médios agricultores e empresários. No entanto, um partido comunista não pode confundir uma orientação para a conjugação de forças com o seu objectivo estratégico principal, não pode abdicar da sua independência, da sua posição político-ideológica estratégica, nem da sua identidade própria por ou para participar em alianças e outras formas de organização."
http://mafarricovermelho.blogspot.com/2012/01/nos-nao-esquecemos-que-milhares-de.html
b) nenhum "povo" pode perfilar-se ao lado da classe burguesa de seu país na competição interimperialista, e isto então vale para os países que constituem os novos "centros" imperialistas, Brasil inclusive.
D- Em outro posicionamento recente de Papariga temos a proposta política do "PCG", ou PC Grego ou simplesmente KKE (tenho que tomar cuidado extremo com os nomes e siglas... para não esquecer jamais o puxão de orelhas, fraterno claro, do meu querido camarada Edmilson, rs):
"O PCG defende a criação de uma Frente Democrática, anti-imperialista e antimonopolista, uma aliança entre trabalhadores (independentes e por conta de outrem) e pequenos e médios agricultores e empresários. No entanto, um partido comunista não pode confundir uma orientação para a conjugação de forças com o seu objectivo estratégico principal, não pode abdicar da sua independência, da sua posição político-ideológica estratégica, nem da sua identidade própria por ou para participar em alianças e outras formas de organização."
http://mafarricovermelho.blogspot.com/2012/01/nos-nao-esquecemos-que-milhares-de.html
Inúmeros problemas para serem desdobrados e analisados nessa citação, exatamente aquela em que o KKE propõe uma “Frente Democrática” – um resumo, mas bem feito e exato no seu essencial. Mesmo salientando o resguardo da independência do partido, aqui está a sua vinculação à estratégia democrático popular e a profunda contradição com a sua descriminação de que a próxima revolução será socialista. No Brasil encontramos, como é fácil documentar inclusive aqui mesmo na ESK, as várias versões da estratégia democrática popular.
Sabemos que o PCB está num esforço, principalmente desde seu último Congresso, de superação da estratégia democrática popular. O resultado que estamos vendo nos casos do KKE e do PCB, aqui talvez com menos intensidade, é que a estratégia democrático popular apenas veio mais à esquerda – mas ainda vige, e muito forte e bem estabelecida, em termos essenciais. Há outros textos do KKE por que passei nessa investigação que expõe com mais desdobramentos essa estratégia de Frente anti-imperialista e anticapitalista.
E - Ainda no mesmo texto, Papariga sobre "desenvolvimento desigual", "sistema imperialista" e "países imperialistas":
"Desenvolvimento desigual quer dizer desenvolvimento político e social desigual, o que significa que as condições prévias para o início da situação revolucionária podem emergir mais cedo num país ou num grupo de países que, sob condições específicas, pode constituir o “elo mais fraco” do sistema imperialista. Isto é particularmente importante hoje em dia, em que o desenvolvimento e as remodelações têm lugar no sistema imperialista e se intensificam as contradições tanto nos países como no sistema imperialista. Portanto, entendemos que cada partido comunista e que os trabalhadores de cada país têm o dever internacionalista de contribuir para a luta de classes ao nível internacional, mobilizando e organizando a luta contra as consequências das crises nacionais, com vista ao derrube do poder burguês, à conquista do poder pelos trabalhadores e à construção do socialismo." (mesmo link)
F - Ao falar sobre a natureza "socialista" da próxima revolução na Grécia, o KKE coloca sua posição em termos internacionais:
"Independentemente do tamanho do país e da sua posição no sistema imperialista internacional, independentemente do continente a que pertence, consideramos que na nova sociedade as relações socialistas que resultam da constituição de um estado revolucionário em que os trabalhadores detêm o poder têm características comuns.
Não concordamos com a ideia da existência de diferentes “modelos” de socialismo nem com as “peculiaridades nacionais” que negam as leis. A realidade de cada sociedade, o tamanho da população rural, o nível dos meios de produção, por exemplo, não negam os princípios e as tendências gerais."
Problemas vários neste ponto, mas aí está o posicionamento do KKE! Cremos que esse posicionamento sugere uma possível hipótese. O KKE está em movimento. De uma posição principista, o que é avesso ao materialismo de Marx, Engels e Lênin, o KKE procura respaldar o porque a revolução é socialista nos seus princípios e na sua materialidade histórica – não só alegando uma “tendência geral”. O KKE estaria colocando a questão dos novos centros imperialistas emergentes para embasar teórica e historicamente uma posição de princípio. Isso iremos ver no decorrer de novas análises.
G - Agora passamos à culminância e a dramática contradição da estratégia essencialmente democrático popular. O KKE, assim como outros partidos da vertente estalinista, como o PCB inclusive, estão num esforço de superar a estratégia democrático popular. A estratégia democrático popular é uma impossibilidade nos próprios termos – mesmo para o KKE que a meu ver é a concepção de fronteira no campo dessa estratégia:
"Outra questão crucial é a de se formar uma opinião unitária sobre uma questão fundamental: se as novas relações socialistas podem resultar de reformas, sem o derrube da burguesia e dos seus órgãos".
Embora já tenha sido tratada, na teoria e na prática, esta questão ressurgiu como forma de pressão em partidos declaradamente marxistas-leninistas. É uma questão estratégica fundamental para o movimento comunista.
Na nossa opinião, a acção da classe trabalhadora e das massas populares num período revolucionário implica o confronto com todas as estruturas burguesas, o seu derrube e a formação de novos órgãos de poder popular.
Só assim a burguesia perderá o poder político através do qual domina, só assim venceremos a sua resistência, pois nunca abdicou do poder voluntariamente. O conceito da revolução socialista não se restringe ao derrube do poder burguês, abrange todo o período de consolidação e predomínio das relações comunistas, até à completa erradicação das classes sociais.
Uma das mais importantes conclusões sobre o carácter da sociedade socialista é a de que esta é uma forma subdesenvolvida, como que um estágio inicial da sociedade comunista.
Vimos que, embora Marx, Engels e Lénine tivessem uma posição clara sobre o carácter teórico do socialismo, na prática, esta posição foi interpretada de forma a sugerir a existência de sociedades distintas, cujo desenvolvimento conduziria ao comunismo.
Independentemente das intenções, esta divisão arbitrária da sociedade comunista em sociedades socialista e comunista constituiu a base para o fortalecimento de pontos de vista oportunistas, tanto no campo das relações de produção socialista, como no campo da super estrutura. Minou o carácter da ditadura do proletariado, do planeamento de âmbito nacional e do carácter do Partido Comunista, como vanguarda político-ideológica da classe operária, durante a consolidação e o desenvolvimento da nova sociedade. Minou o carácter do planeamento central e, finalmente, levou ao enfraquecimento das relações de produção socialista, em vez de as reforçar. Nesta base, podemos explicar o fortalecimento das forças contra-revolucionárias na super estrutura política.
O nosso partido acredita que, segundo a teoria marxista-leninista, o socialismo é o comunismo imaturo, que é o estádio inferior da sociedade comunista, ou seja, o comunismo que está apenas chegando das entranhas do capitalismo e tem que se basear nos fundamentos económico-técnicos herdados do capitalismo.
No entanto, as principais leis da sociedade comunista são válidas no socialismo: a socialização dos meios de produção concentrada, a reprodução ampliada visando a satisfação das necessidades sociais, o planeamento central, o controlo operário e, até certo ponto, a distribuição de acordo com as necessidades (educação e saúde, por exemplo). Devido ao carácter muito imaturo do socialismo, uma parte do produto social (o destinado ao consumo individual) é distribuído de acordo com o princípio “a cada um segundo o seu trabalho”.”(mesmo link)
Vemos o KKE se posicionar na extrema esquerda do vasto campo estalinista.
Vamos comentar um dos aspectos que esse trecho do posicionamento do KKE traz e que tem relação com o nosso assunto âncora – a natureza imperialista do Brasil. Trata-se da estratégia da transição do comunismo inferior (socialismo) para o comunismo superior.
O período de transição para Marx, Engels e Lênin, principalmente este, é a ditadura do proletariado. Há uma discussão se todo o período da transição precisa ser necessariamente uma ditadura do proletariado. Porém não há discussão de que exatamente o INÍCIO da transição será obrigatoriamente um período de ditadura do proletariado. Oras, a ditadura do proletariado não pode de modo algum ser aproximada, diluída, indiferenciada em outros tipos de ditaduras que têm outro tipo de base social, como a “ditadura democrática do proletariado e do campesinato” no caso da Rússia, ou quaisquer outras ditaduras que tenham esta ou mais classes como sustentáculo, tais como “pequenos empresários”, classes médias rurais e urbanas etc...
Os camaradas do KKE parecem recair num erro teórico fundamental e básico que é do b-a-bá do marxismo proletário. A ditadura do proletariado cabe ao proletariado somente, à sua classe e de nenhuma forma a outra classe. Trata-se de uma ditadura de classe. Isso não quer dizer que outras classes não possam vir em apoio ao proletariado e seu programa revolucionário – mas a ditadura de classe não é a sua ditadura como classe que apoia e sim a ditadura do proletariado. No período de transição não se trata, por definição, de uma frente que tem um programa próprio específico, uma condução própria que por ser própria é necessariamente diferente daquela do proletariado. Trata-se então do proletariado no poder do estado revolucionário, seu estado de classe – mais nenhuma classe figura no poder proletário.
Lênin disse que algumas medidas da ditadura democrática do proletariado e do campesinato poderiam ser e de fato foram medidas socialistas, principalmente quando se tratasse da economia urbano-industrial totalmente sob controle do proletariado urbano com o seu operariado industrial. Mas não havia ilusões da parte dele a respeito da natureza histórica da ditadura que estava no poder. Não raro Lênin e Trotsky falaram em vigência da ditadura do proletariado no período que vai desde da tomada do poder até o início da contrarrevolução em 1923/4. Isso se deveu, nesse período, mais às circunstâncias da guerra civil do que à dinâmica econômica. O período de guerra civil de um certo modo reforçou o poder proletário –mas foi conjuntural, como vimos depois na NEP.
A ditadura do proletariado nunca chegou a ser essencialmente e plena na economia de toda a nação russa na acepção estridente do termo, como o seria, p.ex., na Alemanha e outros países desenvolvidos da época caso a revolução proletária vencesse. Mesmo o planejamento era uma necessidade e uma luta, mas foi pouco uma realidade nesse período – os escritos de Lênin a respeito são abundantes. O “Comunismo de Guerra” foi um fortíssimo expediente que ilustra algumas medidas próprias da ditadura do proletariado, mas não foi de modo algum a realização orgânica da transição ao comunismo. Tratava-se a rigor de uma economia de guerra conduzida, aliás com pleno êxito, pelo poder político do proletariado, pelo estado proletário, portanto, trata-se de um magnífico exemplo. O período da Guerra Civil foi um período em que o poder proletário foi exercido na sua plenitude inclusive sobre as correntes da esquerda russa mais ligadas às bases camponesas que se voltaram contra os bolcheviques. Não só sobre correntes com base no campesinato, mas também sobre algumas com base no proletariado urbano, como foi o caso de Cronstadt, os anarquistas etc. Tratou-se, nesse contexto específico, da ditadura do proletariado ou democracia proletária, o seu exato sinônimo.
O POSDR-bolchevique (1912) era não só um partido comunista devido ao seu programa, nem um partido “dos trabalhadores”, um partido que se baseava no marxismo revolucionário, mas era um partido comunista essencialmente e formalmente operário. Era portanto um partido operário comunista. Era operário não só porque representava os interesses históricos ou imediatos do operariado, e nem porque tinha influência sólida no operariado ou porque organizava o operariado segundo concepções e objetivos revolucionários, mas porque era tudo isso sendo fundamentalmente formado por operários comunistas do setor industrial de ponta. Lênin tem várias estatísticas e uma visão clara dos quadros componentes do partido nos seus vários momentos desde 1898, até inclusive no último quando escreve “Melhor poucos mas bons”. Em todas as fases de desenvolvimento do POSDR Lênin sempre teve essa preocupação com o caráter operário e as bases operárias nas bases e nos cargos do partido.
Então a questão: como passar do que poderíamos chamar de “ditadura popular” ou “multiclassista”, que compreende uma coalizão de forças sociais que vão desde o operariado, o proletariado em geral, a pequena burguesia, os pequenos empresários etc... que embasaria o socialismo e o novo estado socialista, para o Comunismo superior como quer a concepção de transição do KKE?
A resposta a essa pergunta, claro, não é nem pode ser instrumental – mas envolve uma profunda questão teórica e de princípios na qual estão profundamente mergulhados hoje todos os comunistas sinceros, como é sem dúvida o caso do PCB, do KKE e outros.
Voltemos à análise de um posicionamento do KKE que já abordamos mas que parece, à primeira vista, genérico demais e principista, ou seja idealista. Trata-se da caracterização da revolução como socialista para todos os lugares. Mas parece que é exatamente essa insuficiência flagrante que o KKE está procurando sanar, quando abre a questão do imperialismo na nova configuração do mercado mundial. O imperialismo na sua configuração atual, e não a passada, parece ser o elemento histórico e material que dá à tese de que a revolução é imediatamente socialista algo a mais do que a razão dos “princípios” e das “tendências gerais”.
As questões que se desdobram a partir desta caracterização dos países emergentes como imperialistas são inúmeras e não estão ligadas somente a existência ou não de uma aristocracia operária, mas também àquela que é crucial: a das modernas classes médias assalariadas! Embora o KKE fale em “pequenos empresários” e etc na sua exposição do arco de alianças, a questão, da qual ele não fala, pelo menos nos textos analisados, é a do fenômeno massivo inerente das economias imperialistas: as modernas classes médias assalariadas!
Se a burguesia é burguesa, imperialista ou pró-imperialista, para países como Brasil, a questão parece ter sido devidamente respondida ou resolvida e superada pelo desenvolvimento das forças produtivas do capital no Século XX.
Então seria como “falar de corda em casa de enforcado” dizer que a burguesia é enfim burguesa e imperialista – já não é mais uma questão significativa para o campo do marxismo revolucionário. Porém, e a respeito das classes médias orgânicas de uma economia imperialista? O abuso no uso dos termos “povo” (abuso que o KKE não faz, porque enumera precisamente o que considera por povo) e “trabalhadores” mascara e simplifica insuportavelmente as questões e dilemas reais das esquerdas revolucionárias hoje. Forjam artificialmente, neste simplismo, um campo consensual muito propício exatamente à estratégia política que elegem – a da frente multiclassista, que alguns querem aclassista, ou seja: quando o KKE quer que essa frente multiclassista seja a base do socialismo, ou seja da transição para o comunismo, quer que esse amálgama seja responsável por uma tarefa que é única e exclusivamente do proletariado revolucionário.
Voltaremos.
Mis besos,
Ivan1871
Texto Originalmente postado na lista internacional de discussão ESKUERRA!
http://br.groups.yahoo.com/group/eskuerra/message/63884
** ESK - Lista de discussão da esquerda na internet.
Nota do Mafarrico: O autor deste texto, professor universitário e intelectual, é um comunista sincero, que debatia suas divergências com meu irmão ( um dos fundadores do Mafarrico) na lista de discussão de esquerda ESKUERRA.
Meu irmão, o considerava um debatedor muito leal e admirava muito sua capacidade intelectual, apesar de suas divergencias, quanto as formas de entender a história de construção socialista do século XX. Além disso, o respeitava profundamente.
O Mafarrico se sente honrado em publicar esse texto de sua autoria, reafirma, como sua, a visão que seu irmão tinha sobre o autor desse texto. E espera , futuramente, publicar outros textos de sua autoria.
O Mafarrico Vermelho
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