Economia de base colonial: o modelo de exploração mineral no Brasil

Economia de base colonial: o modelo de exploração mineral no Brasil
por Wladmir Coelho

"Agora vejamos: A crise econômica iniciada em 2008 aprofunda o discurso neoliberal jogando nos ombros dos trabalhadores as medidas restritivas de sempre. 
No caso da mineração devemos observar a criação de legislações lesivas aos interesses dos trabalhadores. O exemplo do petróleo é escandaloso. As leis 9478 de 1997 e 12351 de 2010 retiram do Brasil o controle do bem econômico petróleo submetendo a política energética nacional às necessidades das multinacionais.

Completando o quadro de privatização a proposta do Marco Regulatório da mineração libera todo e qualquer espaço brasileiro à atividade minerária revelando em seu conteúdo a opção pelo modelo de exploração predatório e exportador.

Temos agora a ampliação do ataque ao mundo natural, a subtração de direitos dos habitantes de territórios com potencial minerador somados a renuncia nacional ao controle do poder econômico resultante da exploração mineral."

Exposição apresentada em 15 de novembro de 2014 durante o primeiro encontro do Comitê Mineiro em Defesa dos Territórios Frente a Mineração.

A crise econômica iniciada em 2008 apresentou como principal característica o aprofundamento das práticas neoliberais. Neste sentido observaremos o ataque às políticas sociais aplicados na forma de reformas associados ao corte nos benefícios assistenciais, precariedade do emprego, redução dos direitos previdenciários.

Estes atos, na prática, pretendem ampliar o poderio internacional dos oligopólios e sua principal característica encontra-se em negar a existência do sistema econômico nacional favorecendo o aprofundamento da política industrial de exportação.

Quando afirmamos a valorização da política de exportação precisamos observar os seguintes aspectos;

A política econômica de fundamentação neoliberal apresenta em sua base o dogma do mercado aberto como forma de proporcionar a concorrência ideal cujo principal objetivo seria a oferta de produtos com preços menores.

Sabemos, entretanto, que este principio ignora a concentração do mercado e valoriza a divisão mundial entre fornecedores de produtos industrializados e aqueles com vocação ao fornecimento de matéria prima ou commodities como preferem dos defensores deste modelo.

Desta forma, embora apelidado de neoliberalismo, verifica-se nesta prática uma semelhança com a política econômica de base colonial. O próprio Adam Smith em seu “Inquérito sobre a natureza e as causas da riqueza das nações” defende o modelo colonial como forma de crescimento das colônias.

O autor inglês defendia, no século XVIII, que o modelo colonial é benéfico às colônias tendo em vista a exploração máxima de seus recursos naturais cujo destino seriam os países industrializados.

Exportando matéria prima em grande quantidade as colônias seriam as responsáveis por garantir a continuidade da produção industrial e conseqüente concorrência mantendo assim os preços estabilizados gerando o processo de trocas ideal.

Smith cita o exemplo das 13 colônias britânicas, cujo crescimento era visível, prevendo o sucesso destas como país caso continuassem a vender produtos agrícolas sem a instituição de uma política industrial mantendo a crença na inexistência de um sistema econômico nacional.

O pensador do século XVIII defendia uma rígida manutenção deste modelo natural; Surgindo rompimentos os países mais avançados deveriam intervir militarmente nos povos considerados atrasados e assim garantir o rumo da “natureza econômica”.

Esta defesa do uso da força aponta a consubstanciação entre Estado e conglomerados industriais, comerciais e financeiros aspecto facilmente detectado em nossos dias bastando para este fim uma análise dos castigos impostos a Venezuela e Bolívia que ousaram propor legislações minerarias com maior controle nacional.

A exploração mineral no Brasil

O Brasil, historicamente, apresenta-se submisso ao modelo de exploração mineral de base colonial. A independência política em 1822 não foi suficiente para estabelecer um modelo econômico voltado para a construção de um sistema econômico nacional.

Desta forma a exploração mineral seguiu o seu ritmo colonial entregue à exploração dos oligopólios em concessões de 90 anos com direito a prorrogação por igual período.

O regime republicano, em seu fundamentalismo liberal, amplia a entrega dos recursos incluindo na primeira Constituição republicana (1891) o aprofundamento da prática colonial através da instituição da propriedade do solo associado ao subsolo (direito de ascensão) fato que possibilitou as empresas multinacionais a reserva ou controle das áreas com potencial mineral adequando a sua exploração a política econômica elaborada para atender aos interesses de seus acionistas.

A critica ao modelo de exploração mineral durante a primeira república encontra-se associada, principalmente, a forma de propriedade dos recursos naturais e utilização do poder econômico decorrente desta atividade para garantir o processo de industrialização nacional.

Neste sentido encontraremos divergências entre defensores de uma maior ou menor intervenção do Estado no setor mineral existindo, todavia, um consenso quanto a necessidade de criação de um modelo nacionalista.

Destacam-se como defensores do modelo nacionalista Monteiro Lobato, Pandiá Calógeras, Arthur Bernardes.

A regulamentação do processo de exploração mineral somente ocorreria em 1934 a partir da elaboração do primeiro Código de Minas. O citado diploma legal, amparado por determinações constitucionais, estabelece o tipo de propriedade do solo distinta do subsolo aspecto mantido nos textos constitucionais e infra constitucionais seguintes.

A regulamentação da exploração mineral possibilitou o aumento da presença do Estado cuja atuação empresarial efetiva-se através da criação de duas empresas mistas: A mineradora Companhia Vale do Rio Doce em 1942 acompanhada da Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda (CSN) inaugurada em 1946.

Ainda no campo da exploração mineral devemos observar com especial atenção o caso do petróleo e sua nacionalização a partir do mesmo período através de legislação própria.

Este mineral energético receberá em 1953 uma legislação protecionista incluindo a criação de uma empresa mista – a PETROBRAS – detentora do monopólio de exploração em território brasileiro.

O planejamento econômico

A presença do Estado brasileiro no processo produtivo não foi estabelecida em função de ações dos gabinetes. Resultam da mobilização popular fundamentada no principio da auto suficiência rompendo com a fórmula instituída em 1500 da simples exploração predatória voltada à exportação.

Vejamos: A atribuição ao Estado de atividades empresariais, conforme observado nos casos da CSN e PETROBRAS pressupõe a existência de uma economia planificada apresentando com clareza seus objetivos.

Vamos transportar para os nossos dias este principio da planificação econômica: A Constituição de 1988 determina em seu artigo 174 o planejamento econômico como determinante para o Estado.

E quais seriam os principais objetivos desta determinação constitucional ? Poder-se-ia afirmar com clareza que a garantia dos direitos mínimos dos cidadãos notadamente aqueles de base econômica.

Agora vejamos: A crise econômica iniciada em 2008 aprofunda o discurso neoliberal jogando nos ombros dos trabalhadores as medidas restritivas de sempre.

No caso da mineração devemos observar a criação de legislações lesivas aos interesses dos trabalhadores. O exemplo do petróleo é escandaloso. As leis 9478 de 1997 e 12351 de 2010 retiram do Brasil o controle do bem econômico petróleo submetendo a política energética nacional às necessidades das multinacionais.

Completando o quadro de privatização a proposta do Marco Regulatório da mineração libera todo e qualquer espaço brasileiro à atividade minerária revelando em seu conteúdo a opção pelo modelo de exploração predatório e exportador.

Temos agora a ampliação do ataque ao mundo natural, a subtração de direitos dos habitantes de territórios com potencial minerador somados a renuncia nacional ao controle do poder econômico resultante da exploração mineral.

O projeto do marco regulatório da mineração submete – e seu texto não faz questão de ocultar o fato – a exploração nacional as necessidades e vontades do mercado. Na prática a política econômica de mineração ampliará a sua submissão a fome de lucro dos acionistas das grandes companhias internacionais acrescido das necessidades de estoque chinês.

Historicamente o Brasil apresentou dois momentos de ruptura com a forma colonial de exploração mineral: A criação da Companhia Vale do Rio Doce e Petrobras. Sabemos todos da necessidade de revisão dos rumos tomados por estas empresas em função das legislações imperialistas adotadas.

A resistência popular criou a Petrobras. A elaboração de um Código Minerário Popular será a garantia da proteção do Mundo Natural e reversão do poder econômico decorrente da exploração mineral em beneficio da aplicação dos direitos de base econômica.


Wladmir Coelho: Historiador, Mestre em Direito, Conselheiro e pesquisador da Fundação Brasileira de Direito Econômico. Entre a sua atividade escrita inclui-se a sua coluna 'Petróleo e Política' no Diário Liberdade.








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