A realidade do desemprego em Portugal

Número de desempregados continua a aumentar
por Eugénio Rosa

"Segundo o INE, em 2012, 40,2 por cento dos desempregados estavam no limiar da pobreza, ou melhor numa situação de verdadeira pobreza para não dizer de miséria. E esta percentagem tem crescido de uma forma rápida a partir de 2010 como revelam os dados do INE. É esta a realidade que o Governo procura esconder enganando a opinião pública, uma realidade que tende ainda a agravar-se mais porque o Governo, na sua ânsia de reduzir o défice orçamental para pagar juros leoninos aos bancos credores e à troika (7600 milhões de euros em 2014 e 8200 milhões de euros em 2015), corta prestações sociais a centenas de milhares de portugueses que já vivem numa situação de pobreza, alguns de pobreza extrema.

Para 2015, o Governo já anunciou que quer cortar mais 100 milhões de euros nestas prestações."

O Governo, na sua ânsia de reduzir o défice orçamental (...) corta prestações sociais a centenas de milhares de portugueses que já vivem numa situação de pobreza, alguns de pobreza extrema


O INE acabou de publicar os dados do desemprego oficial referentes ao 3.º Trimestre de 2014. O Governo, utilizando os dados que abrangem apenas uma parte dos desempregados, veio logo dizer, na sua campanha de manipulação da opinião pública, que o desemprego tinha diminuído, apresentando isso como um êxito da recuperação econômica fruto da sua política de austeridade.

No entanto, se analisarmos não apenas «uma parte» mas também «as outras partes» do desemprego, reveladas igualmente pelos dados do INE, concluímos que entre o 2.º Trimestre de 2014 e o 3.º Trimestre de 2014 o desemprego não diminuiu em Portugal como afirma o Governo, mas até aumentou. Para além disso, se consideramos outros dados oficiais que não apenas os do INE, concluímos que a realidade do desemprego em Portugal, que o Governo e os seus defensores nos media procuram esconder, é muito mais grave e negra do que aquela de que fala o Executivo.

Para isso, comecemos por olhar os dados do INE e da Segurança Social do Quadro 1.





Segundo o INE, tanto os trabalhadores incluídos no grupo «Desemprego oficial» como os incluídos no grupo «Inativos disponíveis que não procuraram emprego» estão desempregados e disponíveis para trabalhar. A única diferença é que os primeiros procuraram emprego no período de referência em que foi feito o inquérito, enquanto os segundos, por estarem desencorajados (por procurarem emprego e nunca encontrarem) ou por qualquer outra razão, não procuraram trabalho no período em que foi feito o inquérito e por isso não são considerados no número de desempregados de que fala o Governo.

É evidente que não é pelo facto de não terem procurado emprego que deixaram de estar no desemprego embora, para o Governo, isso seja razão suficiente para os não considerar como desempregados e, por isso, não se refere a eles quando fala do desemprego. No entanto, se os consideramos e se os somarmos ao desemprego oficial de que fala o Governo concluímos que entre o 2.º Trimestre de 2014 e o 3.º Trimestre de 2014 o seu número passa de 985,5 mil para 991,2 mil, portanto o desemprego efetivo aumentou e não diminuiu, como afirma o Governo. E destes 991,2 mil desempregados que existem, segundo os próprios dados do INE, apenas 318,7 mil, ou seja, somente 32,2%, recebiam subsídio de desemprego em Agosto de 2014. Portanto, 672,5 mil desempregados não tinham direito ao subsídio. É por esta razão que o desemprego é a principal causa da pobreza e da miséria em Portugal, para além das baixíssimas pensões, como mostraremos mais à frente.

Dados oficiais longe da realidade

Para se obter uma informação mais completa da realidade do desemprego em Portugal é preciso também ter em conta o chamado «subemprego a tempo parcial» e os «desempregados ocupados». O primeiro grupo – «subemprego a tempo parcial» – inclui, segundo o INE, aqueles que não trabalham mais horas apenas por não encontrarem um emprego a tempo completo. E segundo o INE, estavam nesta situação, no 3.º Trimestre de 2014, 232,1 mil trabalhadores. O segundo grupo – «os desempregados ocupados» – era constituído, segundo o IEFP, por desempregados em ações de formação (76 220); por desempregados em estágios profissionais (41 847); e por desempregados no chamado «Trabalho socialmente necessário» (29 789). Portanto, em Setembro de 2014, segundo o IEFP, 147 856 desempregados encontravam-se nesta situação. Se somarmos os que estavam na situação de «subemprego a tempo parcial» (232,1 mil) aos «desempregados ocupados» (147,8 mil) obtém-se 379,9 mil que estão numa situação de desemprego, ou de falso emprego (formação, estágios, trabalho socialmente útil, etc.) ou de emprego parcial precário. E estes também não são considerados nos números do Governo.

Se adicionarmos estes 379,9 mil aos 991,2 mil, constantes do Quadro 1, obtém-se 1371,1 mil portugueses que estão no desemprego, ou em falso emprego ou em emprego parcial precário, o que representa 24,7 por cento da população ativa mais inativos disponíveis que não procuraram emprego. Uma realidade negra que está muito longe da «realidade cor de rosa» criada pelo Governo, com a qual procura enganar a opinião pública.

Para clarificar as consequências dramáticas desta política de austeridade recessiva que cria desemprego observe-se os dados do Quadro 2 também do INE.



Segundo o INE, em 2012, 40,2 por cento dos desempregados estavam no limiar da pobreza, ou melhor numa situação de verdadeira pobreza para não dizer de miséria. E esta percentagem tem crescido de uma forma rápida a partir de 2010 como revelam os dados do INE. É esta a realidade que o Governo procura esconder enganando a opinião pública, uma realidade que tende ainda a agravar-se mais porque o Governo, na sua ânsia de reduzir o défice orçamental para pagar juros leoninos aos bancos credores e à troika (7600 milhões de euros em 2014 e 8200 milhões de euros em 2015), corta prestações sociais a centenas de milhares de portugueses que já vivem numa situação de pobreza, alguns de pobreza extrema.

Para 2015, o Governo já anunciou que quer cortar mais 100 milhões de euros nestas prestações.

Mais de 61 000 empregos ameaçados na Função Pública

Existe na proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2015 uma norma cujas consequências têm passado despercebidas aos media e à opinião pública, mas que se for aprovada e implementada determinará certamente o despedimento de dezenas de milhares de trabalhadores na Função Pública. Essa norma é o n.º 1 do art.º 54 que dispõe textualmente o seguinte: «Durante o ano de 2015, os serviços e organismos das administrações direta e indireta do Estado, regionais e autárquicas não podem proceder à renovação de vínculos de emprego público a termo resolutivo a não ser em situações excepcionais, fundamentadas na existência de relevante interesse público, e com autorização do ministro das Finanças e Administração Pública».

Segundo a Direção Geral da Administração e Emprego Público (DGAEP) do Ministério das Finanças, em Junho de 2014 existiam nas Administração Públicas (Central, Local e Regional) 61 145 trabalhadores com «contrato a termo resolutivo», ou seja, a prazo.

Movido pela ânsia de cumprir o défice orçamental de 2,7 por cento, e acossado pela Comissão Europeia e pelo FMI que já dizem que o Governo não cumprirá aquele défice, e que é preciso mais medidas adicionais, poderá acontecer, com base nesta norma, que o Governo se vire ainda mais contra estes trabalhadores fazendo despedimentos em massa. E isto para além das centenas para não falar de milhares que já anunciou que pretende colocar na «situação de requalificação» recebendo apenas 40 por cento da remuneração base empurrando-os assim para o desemprego.


Fonte: Avante - Portugal



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