A burguesia joga a toalha

FHC até cantava o hino nacional, mas a sua bandeira era a Americana
A burguesia joga a toalha
por Edmilson Costa, doutor em Economia pela Unicamp


" A partir da década de 90, a exemplo do que aconteceu na década anterior nos países centrais, ocorreu uma mudança de fundo no interior das classes dominantes e a fração ligada aos negócios financeiros-especulativos passou a hegemonizar completamente a política econômica do Estado, subordinando as outras frações ou impondo rendições unilaterais, cujo resultado é a política neoliberal da década de 90 e, especialmente a do governo FHC."
 
Nota do Mafarrico Vermelho: Embora no sítio www.economes.info  este artigo do Camarada Prof.  Edmilson não seja datado, fica claro, que refere-se e foi escrito no período do govêrno de FHC que terminou em 2002. Apesar disso, este texto é importante para compreendermos o processo de desnacionalização da economia brasileira, hoje em +- 70%.

A década de 90 ficará conhecida na história econômica do País como o período em que as classes dominantes brasileiras, representadas politicamente pelo Estado, abdicaram de qualquer vestígio em relação à soberania nacional e se renderam completamente aos interesses do capital financeiro internacional. Cerca de 80% de todo o patrimônio público, acumulado com luta e sacrifícios ao longo de várias gerações, foi transferido, majoritariamente, para o capital estrangeiro ou para seus sócios nacionais.

Todo os setores siderúrgico, petroquímico, de fertilizantes, transportes, mineração e telecomunicações e bancos estaduais foram privatizados. Além disso, o capital estrangeiro avançou também na área privada, destacando-se os setores de informática, autopeças, supermercados e financeiro, configurando-se assim um severo processo de desnacionalização.
 
É bem verdade que a burguesia brasileira nunca foi exatamente uma defensora dos interesses nacionais. Constituiu-se modernamente associada ao capital estrangeiro, mas com uma peculiaridade importante: articulava-se constantemente com o Estado para obter favores e proteção. Pelas características históricas brasileiras, o Estado foi obrigado a criar um pujante aparato produtivo que possibilitava uma articulação orgânica de interesses com o capital privado. Além disso, em vários setores, como financeiro e de comunicações, supermercados, entre outros, a burguesia nativa tinha hegemonia plena, inclusive protegida por cláusulas legais.
 
No entanto, a partir da década de 90, a exemplo do que aconteceu na década anterior nos países centrais, ocorreu uma mudança de fundo no interior das classes dominantes e a fração ligada aos negócios financeiros-especulativos passou a hegemonizar completamente a política econômica do Estado, subordinando as outras frações ou impondo rendições unilaterais, cujo resultado é a política neoliberal da década de 90 e, especialmente a do governo FHC.
 
Mesmo implementado tardiamente no Brasil, o neoliberalismo procurou compensar o tempo perdido com uma agressividade impressionante, particularmente na segunda metade da década. Um roteiro sumário desse processo, elaborado por pesquisadores da UFRJ (Rocha, Iooty e Ferraz, 2001) pode ser assim reconstituído: em 1991 começa a abertura da economia para o exterior e são abolidas as restrições à participação de empresas estrangeiras no setor de informática; em 93 elimina-se o limite para a participação do capital estrangeiro nas privatizações; as emendas constitucionais de 94 acabam com a diferenciação entre empresa nacional e transnacional; isenta-se ainda do imposto de renda as remessas de lucro para o exterior; em 95 acaba-se com as restrições à entrada do capital estrangeiro no setor de serviço e mineração; posteriormente ocorreu a liberalização financeira.
 
Essas mudanças estruturais abriram espaço legal para o avanço do capital estrangeiro no País em todos os setores da atividade econômica, mediante fusões e aquisições, sucatearam o parque produtivo nacional, fragilizaram o balanço de pagamentos e incrementaram o desemprego.
 
O avanço do capital estrangeiro pode ser medido globalmente pela participação das empresas estrangeiras, nacionais e estatais nas vendas globais. Em 1990, as empresas estrangeiras eram responsáveis por 31% das vendas do universo constituído pelas 500 maiores empresas privadas e 50 maiores estatais, percentual que aumentou para 45,6% em 2000, representando um crescimento na década de mais de 50%. Por sua vez, as privadas nacionais caíram de 42,8% para 35,7% no mesmo período, e as estatais regrediram de 26,2 para 18,7%.
 
O avanço no volume de vendas é expressivo, mas ainda não expressa qualitativamente o fenômeno da desnacionalização, pois o que conta mesmo é que o capital estrangeiro controla os setores estratégicos da economia brasileiros, ficando para os nacionais as áreas menos importantes e menos avançadas tecnologicamente.
 
Para se ter uma idéia, basta dizer que o capital estrangeiro controla (dados de 2000) 90% do setor eletro-eletrônico, 89% do setor automotivo, 86% do setor de higiene, limpeza e cosméticos, 77% da tecnologia da computação, 74% das telecomunicações, 74% do farmacêutico, 68% da indústria mecânica, 58% do setor de alimentos; e 54% do setor de plásticos e borracha.
 
O governo FHC costuma dizer que o Brasil foi um dos países que mais recebeu investimento externo nesse período. No entanto, se verificarmos mais detalhadamente a qualidade do “investimento” realizado no Brasil poderemos constatar uma verdadeira bomba de efeito retardado, pois este capital não veio para construir novas empresas, mas para comprar as já existentes. Do conjunto das 1.149 operações de fusões e aquisições realizadas no País, 55% teve a participação do capital estrangeiro, resultando num quadro de desnacionalização explícita.
 
O capital estrangeiro passou a dominar inteiramente o setor de telecomunicações; das 18 empresas do setor elétrico, 12 foram adquiridos pelo capital externo; no setor de autopeças, os estrangeiros já controlam 60% do faturamento e do investimento; no setor de supermercados, o avanço da desnacionalização é também bastante expressivo: o faturamento do capital estrangeiro já representa 60% do volume de vendas e somente o Carrefour é responsável por 32% desse universo; no setor bancário, antes um tempo da burguesia nacional, somente nos últimos dois anos 23 bancos passaram para as mãos estrangeiros, calculando que o controle externo do setor esteja por volta de 30%; até mesmo na publicidade, há um avanço do controle externo: há 10 anos, das 20 maiores empresas, 14 eram nacionais, hoje são apenas cinco que permanecem nesse ranking.
 
Um aspecto importante a ser ressaltado dessa conjuntura é o fato de que grande parte das privatizações foi realizada com moedas podres, um tipo de papel que estava com valor baixíssimo no mercado, mas que nas operações de privatizações entraram com valor de face. Além disso, o BNDEs, um banco do governo destinado a fomentar a indústria brasileira e a infra-estrutura, transformou-se de fato numa agência governamental para financiamento das privatizações e da desnacionalização do País, dada a presteza com financiava esse tipo de operações. Ressalta-se ainda o fato de que estas privatizações foram realizadas a preços muito inferior ao verdadeiro valor das empresas. Só para se ter uma idéia, uma companhia do porte da Vale do Rio Doce foi vendida por míseros US$ 3,3 bilhões, possivelmente uma décima parte de seu valor efetivo. Além disso, é digno de nota a extensa corrupção que marcou o processo de privatizações, narrada em incontáveis matérias nos meios de comunicação.
 
Não bastasse essa dominação estrangeira no campo econômico, na área política o avanço também é expressivo. Os recentes acordos com o FMI transformaram a equipe econômica em meros operadores graduados das metas estabelecidas por esta organização. A ousadia do capital externo é tamanha que eles agora querem transformar a base de Alcântara, no Maranhão, num protetorado norte-americano, onde as autoridades brasileiras não poderão sequer investigar os conteiners utilizados pelos norte-americanos.
 
Para fechar com chave de prata o processo de dependência encaminhado especialmente no governo FHC, foi autorizado  instalação de um escritório da CIA em São Paulo para espionar legalmente todo brasileiro que não se conforme com a entrega do País e de suas riquezas ao imperialismo.
 
Edmilson Costa    Fonte: Economes.info em http://www.economes.info/#!artigos-edmilson/galleryPage



Mafarrico Vermelho














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