O grande capital financeiro está a pôr-se a salvo

Rivalidades
Por Jorge Cadima
Fonte: Avante!
 
 
A crise dos centros mundiais do capitalismo agrava-se rapidamente. O desastre que se avizinha, e a incapacidade do imperialismo o evitar, acirra todas as contradições e rivalidades, num «jogo do empurra» de consequências imprevisíveis.



A zona euro está à beira da explosão, com a grande finança anglo-saxónica à espreita. A economia grega afunda-se após um ano de pilhagem da Troika, e a Grécia tem hoje a mais baixa notação das agências de rating para qualquer país do mundo (Bloomberg, 19/6). A banca inglesa foge da zona euro (Telegraph, 18/6). Cresce a notável contestação nas ruas do povo grego. No início de Junho o Ministro das Finanças alemão escreveu à Troika «advertindo para uma possível bancarrota da Grécia e admitindo que o actual plano de resgate fracassou. Como alternativa, apela para uma reestruturação de facto» (Der Spiegel, 8/6). A proposta de Schäuble envolveria um pequeno sacrifício para a banca privada: aos «investidores» seria «pedido que trocassem todos os títulos de dívida grega na sua posse por outros cujos prazos seriam alargados em sete anos. Os investidores receberiam o seu dinheiro mais tarde, mas recebê-lo-iam na totalidade». Em contrapartida, seriam intensificadas as privatizações, como por exemplo a empresa energética grega DEI «que teve lucros de 950 milhões de euros em 2010» (Spiegel, 7/6). O Ministro das Finanças irlandês aproveitou para «reavivar um pedido que alguns dos principais detentores de títulos [de dívida irlandesa] aceitassem perdas, a fim de minorar os custos do resgate da banca irlandesa» (Financial Times, 16/6), no qual o governo já injectou 34,7 mil milhões de euros (Bloomberg, 16/6).


Estas propostas desencadearam uma tempestade furiosa. O chefe da eurozona, Jean-Claude Juncker, afirmou que «impôr prejuízos aos investidores poderia desencadear uma versão europeia do colapso bancário da Lehman Brothers […] A proposta alemã é perigosa» (Guardian, 17/6). Mostrando quem realmente manda, acrescentou: «se fizermos algo que seja rejeitado pelo BCE, pelas agências de rating e portanto pelos mercados financeiros, arriscamo-nos a incendiar a zona euro» (Bloomberg, 19/6). A Ministra das Finanças francesa Lagarde concordou. Zapatero «espera que os investidores contribuam de forma voluntária» (Bloomberg, 19/6). O vice-presidente do BCE Vítor Constâncio, que enquanto Presidente do Banco de Portugal ganhava 250 mil euros por ano, mais do dobro do seu congénere dos EUA (ionline, 21/5/09), repetiu: «somos contra qualquer tipo de incumprimento com 'corte de cabelo'» (Spiegel, 16/6), o que em linguagem de gente quer dizer que não se pode exigir um único euro aos banqueiros. Os cortes de cabelo aceitáveis para Constâncio são os dos trabalhadores, a quem quis sempre baixar os salários. O novo patrão americano do FMI (Lipsky) ameaçou cortar os financiamentos (Guardian, 17/6). Sarkozy foi mais longe, ameaçando que «sem o euro não há Europa e sem Europa não é possível a paz e a segurança» (BBC, 17/6). A Alemanha recuou. Falta saber até que ponto é que a corda entre o colosso da Europa capitalista e os seus directos competidores na zona euro pode esticar. A imprensa anglo-saxónica repete apelos para que a Alemanha saia do euro (Telegraph, 18/6). Mas os EUA são uma bomba-relógio ainda maior que a zona euro.

O Der Spiegel (8/6) levanta a ponta do véu de tanta resistência: «se se quer obrigar o sector privado a custear uma parte dos resgates, tal terá de acontecer dentro em breve. […] Já hoje um montante considerável da dívida da Grécia foi transferida para o público. […] Mais cedo ou mais tarde, os investidores privados ter-se-ão despojado totalmente dos seus investimentos de alto risco na Grécia». É este o verdadeiro objectivo dos «planos de resgate» da Troika. Resgate para a banca, afundamento para os povos e os países. É para aqui que vai o dinheiro dos nossos salários e reformas. O grande capital financeiro está a pôr-se a salvo, antes do inevitável colapso que gerou. Hoje, lutar é a única alternativa ao desastre para o qual o capitalismo «triunfante» nos conduziu. Ou o capital financeiro, ou os povos. Há cada vez menos alternativas de compromisso.





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