Leninismo e revisionismo nas questões fundamentais da teoria e prática
(A ditadura do proletariado, a sua forma de organização e essência econômica)
por V.A. Tiúlkine M.V. Popov
«Não há meio-termo. Só sonham em vão com o meio-termo os fidalgotes, os intelectuaizinhos, os senhoritos que estudaram mal em maus livros. Em nenhuma parte do mundo existe meio-termo nem pode existir. Ou a ditadura da burguesia (encoberta com pomposas frases dos socialistas-revolucionários e dos mencheviques sobre o poder do povo, a Constituinte, as liberdades, etc.), ou a ditadura do proletariado. Aquele que não tiver compreendido isto da história de todo o século XIX é irremediavelmente um idiota». V.I. Lenine
O papel dos intelectuais revisionistas na onda parlamentarista atual. A generalização do discurso reformista, especialmente entre os intelectuais ditos marxistas e de esquerda, tem muito a ver com a incapacidade de ver a centralidade das classes nos processos políticos. Como é o caso da incapacidade de ver que o carácter pequeno-burguês das chamadas frentes populares hegemonizadas por partidos sociais-democratas (particularmente depois da segunda guerra mundial) determinou os fiascos de diversas tentativas de as ressuscitar depois de elas esgotarem o seu prazo de validade combatendo o nazismo, especificamente na Europa. Falo da via pacífica chilena por exemplo. A generalidade dos intelectuais desta vaga reformista (e pseudo-comunista revisionista) actual escondem a sua incapacidade de seguir e subordinar-se à luta da classe operária – que é a única classe que pode liderar a revolução proletária – através dos frentismos, que servem para mascarar a conciliação de classes. Em teoria as teses gramscianas, dimitrovistas e outras adaptadas ao reformismo moderno colocam operários e pequeno-burgueses como pares na direcção do movimento de massas (o que já de si é anti-marxista e anti-leninista) mas na prática dão sempre a liderança à pequeno-burguesia ao deslocar o centro da luta das empresas (dos meios de produção) para os parlamentos (os meios de gestão burguesa).Fonte: Pelo Anti-Imperialismo
Em 2009, o Fundo da Academia Operária, que proporciona formação aos operários da Rússia, publicou a colectânea O Principal no Leninismo, que inclui as teses fundamentais que caracterizam as posições teóricas leninistas sobre a questão da abordagem de classe na análise dos fenômenos sociais e sobre a ditadura do proletariado. A sua leitura ajuda a compreender a renúncia e a defecção da direção do PCUS que, no XXII Congresso [1961], assumiu uma posição revisionista sobre questões fundamentais do marxismo-leninismo, fixando-a no Programa do PCUS e, desse modo, predeterminou a decomposição do partido e a destruição do país. Isto é demonstrado também no presente artigo. Os autores procuraram prestar especial atenção ao facto de que, a maioria das invencionices, pretextos e argumentos «actuais» dos oportunistas e renegados de hoje, tiveram uma resposta de Lenine ainda na época da luta contra os oportunistas e deturpadores do marxismo, na época da II Internacional e da instauração do poder soviético na Rússia.
O carácter de classe do Estado
Que qualquer Estado tem um carácter de classe é o á-bê-cê do marxismo, e Lenine
chamou a atenção para isto, pode-se dizer, permanentemente.
No artigo «A posição pequeno-burguesa ante o problema da ruína», Lenine
escreve: «Na questão do Estado, distinguir em primeiro lugar qual classe o Estado
serve, qual classe cujos interesses promove».
No livro O Estado e a Revolução sublinha-se que «segundo Marx, o Estado é um
órgão de dominação de classe».
No artigo «A catástrofe que nos ameaça e como combatê-la», Lenine coloca a
questão: «E o que é o Estado?» ao que responde: «É a organização da classe
dominante».
Esta mesma ideia é explicada no artigo «Conservarão os bolcheviques o poder
de Estado?»: «O Estado, estimados senhores, é um conceito de classe. O Estado é um
órgão ou uma máquina de violência de uma classe sobre outra».
No «Relatório ao II Congresso dos Sindicatos de Toda a Rússia, Janeiro de
1919», V.I. Lenine sublinha de um modo ainda mais categórico: «A questão coloca-se
assim e apenas assim: ou a ditadura da burguesia – encoberta com Constituintes e todo
o tipo de eleições, democracia e demais embustes burgueses, com os quais deslumbram
os tolos e dos quais apenas se podem vangloriar e regozijar pessoas que se tornaram
completamente e em toda a linha renegados do marxismo e renegados do socialismo –
ou a ditadura do proletariado».
Por isso, é perfeitamente lógico que no Programa do PCR(b), preparado por
Lenine, se afirme de modo unívoco: «Em oposição à democracia burguesa, que oculta o
carácter de classe do Estado, o poder soviético reconhece abertamente o carácter
inelutável de classe do qualquer Estado, enquanto não desaparecer a divisão da
sociedade em classes e com ela todo o poder de Estado».
Na brochura «Carta aos operários e camponeses a propósito da vitória
sobre Koltchak», Lenine sublinha o carácter de classe do Estado de forma ainda mais
decidida: «Ou a ditadura (isto é, o poder férreo) dos latifundiários e dos capitalistas, ou
a ditadura da classe operária.
«Não há meio-termo. Só sonham em vão com o meio-termo os fidalgotes, os
intelectuaizinhos, os senhoritos que estudaram mal em maus livros. Em nenhuma parte
do mundo existe meio-termo nem pode existir. Ou a ditadura do proletariado da burguesia (encoberta com pomposas frases dos socialistas-revolucionários e dos
mencheviques sobre o poder do povo, a Constituinte, as liberdades, etc.), ou a ditadura
do proletariado. Aquele que não tiver compreendido isto da história de todo o século
XIX é irremediavelmente um idiota».
A essência do Estado socialista
No «Discurso de encerramento do debate sobre o relatório do Conselho
de Comissários do Povo, 12 (25) de Janeiro de 1918, no Terceiro Congresso dos
Sovietes de Deputados Operários, Soldados e Camponeses de Toda a Rússia», V.I.
Lenine disse: «A democracia é uma das formas do Estado burguês, a favor da qual
estão todos os traidores do verdadeiro socialismo, que se encontram hoje à frente do
socialismo oficial e afirmam que a democracia está em contradição com a ditadura do
proletariado. Enquanto a revolução não saiu do quadro do regime burguês, nós éramos
a favor da democracia, mas assim que vimos os primeiros alvores do socialismo ao
longo de todo o decurso da revolução, tomamos a posição firme e resoluta de defesa da
ditadura do proletariado».
Na brochura «Êxitos e Dificuldades do Poder Soviético», V.I. Lénine
simplesmente ridicularizou aqueles pesudo-comunistas que negavam a ditadura do
proletariado. Escreveu: «Nós, certamente, não somos contra a violência; troçamos
daqueles que têm uma atitude negativa para com a ditadura do proletariado e dizemos
que são tolos, incapazes de compreender que tem de haver ou ditadura do proletariado
ou ditadura da burguesia. Quem disser outra coisa ou é idiota ou politicamente tão
ignorante que seria uma vergonha admiti-lo não apenas numa tribuna mas mesmo
simplesmente numa reunião.»
Lenine defendeu esta mesma ideia no «Discurso sobre a situação Interna e
Externa da República Soviética na Sessão Plenária Extraordinária do Soviete de
Moscovo de Deputados Operários e Soldados Vermelhos, em 3 de Abril de 1919»: «Ou a
ditadura da burguesia ou o poder e a ditadura completa da classe operária, em parte
alguma o meio-termo pode dar alguma coisa e em parte alguma dele algo resultou».
No trabalho «Sobre a ditadura do proletariado», V.I. Lénine escreveu o
seguinte: « A principal fonte da incompreensão da ditadura do proletariado por parte
dos socialistas é não levarem até ao fim a ideia da luta de classes (cf. Marx. 1952).
«A ditadura do proletariado é a continuação da luta de classe do proletariado sob
novas formas. Isto é o fulcro, e é isto que não compreendem. O proletariado como
classe particular, continua sozinho a travar a sua luta de classe.
«O Estado é apenas = a instrumento do proletariado na sua luta de classe. Um
tipo especial de moca».
No «Discurso no Congresso dos Operários dos Transportes de 27 de
Março de 1921», V.I. Lenine explicou mais uma vez que a questão é «um ou outro»: «A
classe que tomou nas suas mãos o domínio político, tomou-o com a consciência de que o
tomava sozinho. Isto está contido no conceito de ditadura do proletariado. Este conceito
só tem sentido quando uma classe sabe que toma sozinha nas suas mãos o poder
político e não se engana nem a si mesma nem aos demais com conversas sobre um
poder de “todo o povo”, resultante de eleições gerais e consagrado por todo o povo.
Como sabeis perfeitamente, os aficionados de tal palavreado são muitos e até mais que
muitos, mas, em todo o caso, não são do proletariado, uma vez que os proletários
tomaram consciência e escreveram tanto na Constituição como nas principais leis da
República que se trata de ditadura do proletariado».
Na brochura «Sobre o Imposto em Espécie», V.I. Lenine sublinha de modo muito
simples e sucinto: «O socialismo é inconcebível sem o domínio do proletariado no
Estado: isso é o á-bê-cê».
O conceito, as tarefas e os limites históricos
da ditadura do proletariado
No artigo «Os que estão assustados com a falência do velho e os que lutam pelo novo», V.I. Lénine assinala que «a ditadura pressupõe e significa uma situação de guerra contida, uma situação de medidas militares de luta contra os adversários do poder proletário».
Na mesma altura, no artigo «Saudação aos operários húngaros», sublinha: «Mas a essência da ditadura do proletariado não reside apenas na violência, nem principalmente na violência. A sua essência principal reside na organização e disciplina do destacamento avançado dos trabalhadores, da sua vanguarda, do seu único dirigente, o proletariado. O seu objectivo é criar o socialismo, suprimir a divisão da sociedade em classes, fazer de todos os membros da sociedade trabalhadores, retirar a base de toda a exploração do homem pelo homem.» Lenine esclarece: «A supressão das classes é resultado de uma luta de classes longa, difícil e obstinada, que não desaparece (como imaginam os representantes vulgares do velho socialismo e da
velha social-democracia) depois do derrubamento do poder do capital, depois da
destruição do Estado burguês, depois da implantação da ditadura do proletariado, mas
apenas muda de forma, tornando-se em muitos aspectos ainda mais encarniçada.»
Na brochura «Uma Grande Iniciativa», V.I. Lenine dá a seguinte definição de
ditadura do proletariado: «A ditadura do proletariado, se traduzirmos esta expressão
latina, científica, histórico-filosófica, para uma linguagem mais simples, significa o
seguinte:
«só uma classe determinada, a saber os operários urbanos e em geral os operários
das fábricas, os operários industriais, está em condições de dirigir toda a massa de
trabalhadores e explorados na luta para derrubar o jugo do capital, no processo do
próprio derrubamento, na luta para manter e consolidar a vitória, na obra da criação
do novo regime social, do regime socialista, em toda a luta pela completa supressão das
classes. (Notemos entre parênteses: a diferença científica entre o socialismo e o
comunismo consiste apenas em que a primeira palavra designa a primeira fase da
sociedade nova que nasce do capitalismo, e a segunda palavra designa uma fase
superior mais avançada dessa sociedade).
«O erro da internacional amarela de “Berna” consiste em que os seus chefes só em
palavras reconhecem a luta de classes e o papel dirigentes do proletariado, receando
levar as suas ideias até ao fim, receando precisamente a inevitável conclusão que causa
particular horror à burguesia e que é absolutamente inaceitável para ela. Receiam
reconhecer que a ditadura do proletariado é também um período de luta de classes, que
é inevitável enquanto as classes não tiverem sido suprimidas e que muda as suas
formas, tornando-se particularmente encarniçada e particularmente específica durante
os primeiros tempos após o derrubamento do capital. Uma vez conquistado o poder
político, o proletariado não cessa a sua luta de classe, antes a continua até à supressão
das classes, mas naturalmente noutras condições, sob outras formas e com outros
meios.
«E que quer dizer “supressão das classes”? Todos aqueles que se dizem socialistas
reconhecem este objectivo final do socialismo, mas nem todos, longe disso, refletem no
seu significado. Chama-se classes a grandes grupos de pessoas que se diferenciam entre
si pelo seu lugar no sistema de produção social historicamente determinado, pela sua
relação (as mais das vezes fixada e formulada nas leis) com os meios de produção, pelo
seu papel na organização social do trabalho e, consequentemente, pelo modo de
obtenção e pelas dimensões da parte da riqueza social de que dispõem. As classes são
grupos de pessoas, um dos quais pode apropriar-se do trabalho do outro graças ao
facto de ocupar um lugar diferente num regime determinado de economia social.
«É claro que, para suprimir por completo as classes, é preciso não só derrubar os
exploradores, os latifundiários e capitalistas, não só abolir a sua propriedade, é preciso
abolir ainda toda a propriedade privada dos meios de produção, é preciso suprimir
tanto a diferença entre a cidade e o campo como a diferença entre trabalhadores
manuais e intelectuais. É uma obra muito longa.»
No artigo «A Economia e a política na época da ditadura do proletariado»,
V.I. Lenine continua a definir as fronteiras da ditadura do proletariado e sublinha a sua
vigência ao longo de toda a fase do socialismo: «O socialismo é a supressão das classes.
A ditadura do proletariado fez tudo o que podia para essa supressão. Mas é impossível
suprimir as classes de repente.
E as classes mantiveram-se e manter-se-ão durante a época da ditadura do
proletariado. A ditadura tornar-se-á inútil quando as classes tiverem desaparecido.
Sem a ditadura do proletariado elas não desaparecerão.
As classes mantiveram-se, mas cada uma delas modificou-se na época da ditadura
do proletariado; modificaram-se também as suas inter-relações. A luta de classes não
desaparece sob a ditadura do proletariado, toma apenas outras formas.»
Estas formas, assinale-se, foram expressamente enumeradas por V.I. Lénine, para os
comunistas de todos os países e de todos os tempos, no livro A Doença Infantil do
«Esquerdismo» no Comunismo: «A ditadura do proletariado é uma luta tenaz,
sangrenta e não sangrenta, violenta e pacífica, militar e econômica, pedagógica e
administrativa contra as forças e as tradições da velha sociedade.»
No socialismo é travada uma agudíssima luta de classes contra as forças e tradições da
sociedade capitalista, antes de tudo, contra o espírito pequeno-burguês e as suas
manifestações por parte dos representantes das classes e estratos da sociedade socialista,
nomeadamente a tendência pequeno-burguesa de dar à sociedade o mínimo e o pior
possível e receber dela o máximo e o melhor possível. Esta luta é travada dentro da
própria classe operária, dentro do próprio partido, dentro da consciência de
praticamente cada indivíduo.
Até que momento não se pode prescindir da ditadura do proletariado? Nas «Teses do
relatório sobre a táctica do PCR, no III Congresso da Internacional Comunista, 22
de Junho-12 de Julho», Lenine responde a esta questão: «A ditadura do proletariado
não significa o fim da luta de classes, mas a sua continuação sob uma nova forma e
com novas armas. Enquanto subsistirem as classes, enquanto a burguesia derrubada
num país decuplicar os seus ataques contra o socialismo à escala internacional, essa
ditadura é necessária».
E porquanto «a tarefa do socialismo consiste na supressão das classes», como se
sublinha no «Relatório sobre a táctica do PCR, no III Congresso da Internacional
Comunista, 5 de Julho de 1921», o período da ditadura do proletariado abrange toda a
primeira fase do comunismo, ou seja, todo o período do socialismo.
Leia texto completo em Para a História do Socialismo
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