O ideólogo anticomunista e antimarxista Michel Onfray atacou outra vez


O ideólogo anticomunista e antimarxista Michel Onfray atacou outra vez 

Annie Lacroix-Riz*

Caros amigos, 

Alguns correspondentes acabam de me alertar para as elucubrações de Michel Onfray, cuja actividade mediática consiste em denegrir toda a herança das Luzes e principalmente o marxismo, das quais este é um continuador essencial. Como se sabe, ele trabalha não apenas no plano filosófico mas também no plano histórico, sendo a história o seu domínio privilegiado de incompetência, tal como as suas pretensões. Sempre sem contradição, o que é mais seguro. Naturalmente, ele exerce o seu magistério em nome do «radicalismo» absoluto, sem concessões, método que faz lembrar aquele que usavam os sub-sinarcas (1) ideológicos de «esquerda» de antes da guerra. Uns, esquerdistas, bramavam, depois da assinatura do pacto franco-soviético de maio de 1935, contra os comunistas belicistas, sustentados pelo dinheiro do banco Worms, de Lemaigre-Dubreuil e que tais, e muitas vezes com o do Reich; os sindicalistas, esquerdistas e direitistas reunidos, urravam contra a «infiltração» dos bolcheviques na CGT que não se preocupavam senão em propagandear a URSS ao serviço do infame Estaline, etc. Esquerdistas desgrenhados e direitistas da clique Belin-Froideval faziam coro com eles, enquanto os segundos se encarregavam, no seu semanário

Syndicats, de garantir a paz social (quer dizer, a apoiar a redução dos salários) e a propagar junto da classe operária e dos assalariados a Paz, simplesmente, contra um Reich que não era assim tão perigoso. Os interessados acabaram praticamente todos (os direitistas sem exceção) no campo da colaboração stricto sensu. Os leitores encontrarão indicações a este respeito na obra Le choix de la défaite e De Munich à Vichy (2). Consagrei um estudo de que assinalarei a publicação (data que ainda não está assente) aos sindicalistas da corrente confederada «Syndicats», que prosperaram sob a Ocupação – depois de eles próprios terem presidido à liquidação oficial da CGT (decreto assinado em novembro de 1940 pelo seu chefe de fila René Belin, falso ministro da produção industrial e do trabalho, vassalo do grande banqueiro sinarca Jacques Barnaud, director geral do banco Worms): «A Derrota de 1940: a interpretação de Marc Bloch e dos seus seguidores»,  comunicação ao colóquio Marc Bloc, Rouen, 8-10 de fevereiro de 2012,  Atas, a publicar. 



A clique Belin-Froideval era abertamente de direita e pró-patronal, mas os «antibelicistas» reclamavam-se também da esquerda radical, como Onfray. Do radicalismo mais puro de Onfray nem o infeliz Freud se teria livrado: naturalmente, este último não chegava aos calcanhares do grande Camus, cuja principal contribuição para o combate anticolonialista foi opor-se com unhas e dentes à independência da Argélia – sempre em nome do progressismo e da grande civilização «ocidental», da qual os «colonialistas» de esquerda se reclamavam desde o princípio do colonialismo, para apoiar o colonialismo de direita, (falsa) oposição cujo modelo Jules Ferry e Clemenceau tinham fixado nas suas intervenções na Câmara de Deputados, em 28 e 30 de julho de 1885. 

O pretensioso e inculto Onfray, em novembro de 2011, já zurziu Guy Môquet (assim como o historiador muito direitista Jean-Marc Berlière, especialista da polícia, morbidamente obcecado pelo PCF). O que se passa hoje na França   verdade revolucionárias, todos os heróis comunistas da resistência: nem Georges Politzer, a cuja tortura mortal o «homem de sangue» Pierre Pucheu quis assistir pessoalmente (ver Industriais e banqueiros franceses sob a Ocupação, índex) lhe terá escapado.

Não posso resumir aqui o que haverá a dizer sobre estas práticas encapotadas por detrás desta falsa crítica de «esquerda». Mas no meu sítio existem vários trabalhos que fazem o ponto deste «esquerdismo» na aparência e sobre a exploração que ele fez do pacto germano-soviético, a mais inteligente decisão soviética do tempo imediatamente anterior à guerra. Neste aspeto, nunca nada distinguiu este falso «radicalismo» da ideologia da direita (extrema ou não) desde 23 de agosto de 1939: têm em comum a ocultação sistemática da verdade histórica, seguindo muito de perto a que foi defendida por Churchill desde 4 de outubro de 1939, perante a Câmara dos Comuns. 

Ver designadamente: 

1º. «O PCF entre o ataque e a mea culpa: junho de 1940 e a resistência comunista», 2007, réplica a uma outra tentativa de «esquerda» criticando o abominável pacto germano-soviético e por conseguinte, a traição da classe operária francesa pelo PCF ao serviço dos Sovietes – através de uma obra absolutamente desprovida de fontes e que foi objeto, como é natural, de um considerável eco mediático; 

2º. A crítica da notável obra de Geoffrey Roberts: «Geoffrey Roberts, As guerras de Estaline, desde a guerra mundial à guerra-fria, 1939-1953: um acontecimento editorial», 2007, obra ainda não traduzida e que nunca o será. Ele acaba de enviar o seu último trabalho, sobre Jukov, que terá, conforme todas as probabilidades, o mesmo triste destino em França: General de Estaline, a vida de Georgy Zhukov, Londres, Icon Books, 2012. 

O seu colega e amigo Michael Jabara Carley, que também é visado nesta crítica, é autor de uma obra que demonstrou formalmente a não-responsabilidade da URSS no falhanço da aliança tripartida de 1939 – e na própria assinatura do pacto de não-agressão germano-soviético, 1939, the alliance that never was and the coming of World War 2 (4), Chicago, Ivan R. Dee, 1999. Como ele trabalha no Canadá, a sua obra foi traduzida e merece uma notoriedade que é atualmente inimaginável em França: 1939, a aliança da última oportunidade. Uma reinterpretação das origens da Segunda Guerra Mundial, As publicações da universidade de Montréal, 2001. 

Em resumo, há poucas hipóteses de que a France Culture, que tanto gosta da cultura anglófona, nos apresente este duo «crítico» das asneiras correntes nos grandes média. 

Encontrarão em Le choix de la défaite e De Munich à Vichy (2) muitas indicações que confirmam a futilidade e a ignorância do ideólogo anticomunista e antimarxista Michel Onfray. Mas os dois artigos acima citados sintetizam: 1º, o que foi objectivamente o pacto germano-soviético; 2º, o uso que o «ocidente» cúmplice do Reich hitleriano fez disso. 

Aproveito para informar que interrompi por um mês o pesado trabalho de Industriais e banqueiros franceses sob A Ocupação para preparar um outro, A história contemporânea sob influência, preparado para a actualização regular do dossiê desde 2004. As ruínas da história, reflexo da situação geral, merecem toda a nossa atenção. A obra, que será publicada mais uma vez na editora Tempo das Cerejas, estará pronta para a festa de l’Huma (5) e proporcionar-nos-á assunto de discussão.


Boas férias e amizade para todos,

Annie Lacroix-Riz
* Annie Lacroix-Riz

é professora de História Contemporânea, na Universidade de Paris 7 – [NT]
.
 
1. Elemento de uma sociedade política secreta – Synarchie –, real ou suposta, evocada em França nos anos 30-40, que estaria ligada à emergência do movimento tecnocrático – http//fr.wikipedia.org/wiki/Synarchie. A autora do artigo considera que essa organização existiu realmente – [NT].
2. A escolha da derrota e De Paris a Vichy – [NT].

3. É uma rádio cultural de serviço público audiovisual francês (grupo Radio France) – http//fr.wikipedia.org/wiki/France_Culture – [NT]. 

4. A aliança que nunca foi e a chegada da II Guerra Mundial – [NT].

5. L’Humanité – diário afeto ao PCF – [NT].



Texto original em pelosocialismo.net


O Mafarrico Vermelho

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