A BRIGA COM AS FARC FICOU GRANDE DEMAIS PARA URIBE
A briga com as FARC ficou grande demais para Uribe
original em:
Com o acordo para o estabelecimento de sete bases militares norteamericanas em território colombiano, o Governo do presidente Álvaro Uribe Vélez, não somente entrega a soberania como também reconhece que a briga com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) ficou grande demais para ele.
ABN
Foi o que expressou o chefe máximo das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Alfonso Cano, em entrevista concedida à revista neogranadina “Cambio”, cujo conteúdo foi divulgado nesta última quarta-feira.
Na sua primeira entrevista para qualquer meio de comunicação, desde que assumiu o cargo máximo das Farc, o chefe guerrilheiro, substituto do legendário Manuel Marulanda Vélez, o “Tiro Fijo”, dialogou via internet com “Cambio”.
Na conversa, o chefe guerrilheiro fala sobre os lança-foguetes com os quais as autoridades de Bogotá acusam à Venezuela de fornecê-los às Farc e revela como os obtiveram.Acrescentou que desde que o presidente Chávez foi retirado como negociador do processo interno de paz, não tem mantido contato com seu governo, ainda assim persiste a admiração pelos objetivos da sua gestão e a gratidão pelos seus esforços em prol do acordo humanitário.
Também se refere à suposta ajuda financeira que, segundo Bogotá, os insurgentes teriam fornecido à campanha eleitoral do atual presidente equatoriano, Rafael Correa.
Expressa que a Casa de Nariño e o Governo de Washington têm feito de tudo com os supostos computadores capturados do Comandante Raúl Reyes. “Os computadores supostamente encontrados têm o que os governos de Bogotá e Washington querem que contenham. Tem feito deles uma lâmpada de Aladim à que recorrem quando precisam uma desculpa ou justificativa”.
Também reflexiona sobre o significado que para as Farc teve a morte de Marulanda e fala da situação geral das Farc, das quais diz: “não temos problemas internos graves nem estamos em crise”
A seguir a entrevista:
__CAMBIO: Depois de que o presidente Uribe suspendeu a mediação do presidente Chávez na libertação dos sequestrados, as Farc continuaram tendo contatos com o Governo venezuelano?
__ALFONSO CANO: Não. Retirado o presidente Chávez como facilitador desse processo, cessaram nossas conversações, mas nossa admiração pelos seus objetivos bolivarianos do Governo venezuelano é a mesma de sempre e nossa gratidão pelos seus esforços em prol de um acordo humanitário será permanente.
__ CAMBIO: Você reconhece que o governo Uribe isolou às Farc no plano internacional?
__ALFONSO CANO: Enquanto se desenvolveram os diálogos de El Caguán ampliamos as relações com governos e organizações nos diferentes continentes. Interrompidos os diálogos, o governo Pastrana e a Casa Branca iniciaram uma ofensiva diplomática contra as Farc que, obviamente, gerou modificações nas formas de nos relacionarmos com a comunidade internacional. Mas mantemos relações em todo o mundo, sujeitas à devida discrição.
__ CAMBIO: A sensação é de que as Farc tem perdido interlocução internacional, que já não são tão fortes nesse campo.
__ ALFONSO CANO: Não poderia precisar quão tão fortes somos nesse campo porque é uma apreciação subjetiva, mas lhe garanto que, nas novas condições da diplomacia do século XXI, manteremos muito boas relações em muitas partes do mundo.
__ CAMBIO: O que significam a Venezuela e o Equador dentro da sua estratégia política?
__ ALFONSO CANO: O sonho bolivariano de uma pátria grande que integre todos os povos da América Latina e Caribe, que libere o seu enorme potencial de forma soberana e nos coloque diante o mundo como a grande nação que devemos ser.
__ CAMBIO: Que efeitos teve a morte de ‘Reyes’ para os vínculos externos das Farc?
__ ALFONSO CANO: ‘Raúl’ era o responsável das relações internacionais das Farc e, obviamente, sua morte teve um impacto importante nesse nível, mas dado que nas Farc todos os trabalhos de direção são analisados, planificados e desenvolvidos em equipe, podemos recobrar o ritmo. Hoje, a responsabilidade de lhe dar uma dinâmica adequada às necessidades do momento é do comandante ‘Iván Márquez’.
__ CAMBIO: A captura dos computadores de ‘Raúl Reyes’ deixou as Farc a descoberto, praticamente sem segredos...
__ ALFONSO CANO: Com os supostos computadores de ‘Raúl’, o que tem sido apresentado é uma mal feita manipulação propagandistica dos governos da Colômbia e dos Estados Unidos: como cortina de fumaça ou para ganhar pontos em alguma pesquisa, ou ainda para difundirem suspeitas públicas sobre algum presidente de países vizinhos toda vez que acham necessário. A retidão de muitas figuras públicas tem sido submetida ao escárnio e à lapidação. Nada do atribuído aos computadores tem sido sério e o pouco que ocorreu, pelo rigor da justiça, foi descartado por inconsistência.
__ CAMBIO: Os e-mails entre o Secretariado, encontrados nesses computadores, indicam que as Farc têm negócios de narcotráfico e de armas, além de investimentos na Venezuela.
__ ALFONSO CANO: Os computadores supostamente encontrados têm o que os governos de Bogotá e Washington querem que contenham. Fizeram deles uma lâmpada de Aladim à que recorrem quando precisam de uma desculpa ou justificativa. Foram transformados em aríetes contra os povos vizinhos, ao converter as ‘infiltrações’ ordenadas pela Presidência em pontas de lança da diplomacia colombiana e, em muitas ocasiões, da política interna, sem que ninguém possa dar fé da veracidade da informação, que difundem venenosamente.
__ CAMBIO: Também há comunicações entre membros das Farc com pessoas do gabinete do presidente do Brasil, ‘Lula’ da Silva. Qual é a relação com esse governo?
__ ALFONSO CANO: Na época do processo de El Caguán participaram, de diversas formas, muitos governos e organizações da comunidade internacional. O demais são especulações irresponsáveis.
__ CAMBIO: De quanto realmente foi a contribuição econômica das Farc à campanha de Rafael Correa a que o ‘Mono Jojoy’ se refere num vídeo conhecido há poucos dias?
__ ALFONSO CANO: Não temos entregado nem armas nem dinheiro a governos ou organizações de outros países, pois o que conseguimos mal dá para nosso próprio gasto. Por quê teríamos de contribuir com a campanha eleitoral de uma pessoa, como o atual presidente Rafael Correa, que sequer conhecemos?
__ CAMBIO: Como foram parar em poder das Farc os lança-foguetes que a Suécia vendeu ao Governo da Venezuela e que o Exército colombiano capturou em outubro de 2008?
__ ALFONSO CANO: Uribe recorreu ao terror midiatico para insinuar que o Governo da Venezuela nos facilitou lança-foguetes que teríamos capturado faz muito tempo num enfrentamento militar na fronteira, fato que foi amplamente informado à opinião pública naquela época. Nem os povos nem os governos do mundo são tão tolos como pensam o Pentágono e a Casa de Nariño. Simplesmente trata-se de cozinhar as condições para justificar a entrega da soberania nacional da Colômbia a Washington, reconhecendo que a briga contra as Farc ficou grande demais para ele.
__ CAMBIO: O que significou para as Farc a perda de Manuel Marulanda?
__ALFONSO CANO: A ausência de nosso líder e guia, de nosso referencial fundamental e nosso eixo. Mas também do mestre que nos inculcou a irrevogável decisão de perdurar no esforço que ele começou na companhia de Jacobo Arenas e seus companheiros de Marquetalia. Ensinou-nós, como na poesia de Neruda, que o mundo não termina em nós mesmos.
__ CAMBIO: E o assassinato de ‘Iván Rios’ em mãos de um subalterno? Isso foi interpretadocomo um sinal da crise e da decomposição que as Farc vivem...
__ ALFONSO CANO: É um fato espantoso, mas absolutamente isolado, de um demente ambicioso, percebido pelos serviços de inteligência do Estado, que foi capaz de assassinar covardemente a um revolucionário de grandes qualidades como ‘Iván’ e depois proceder com a crueldade que o mundo inteiro conheceu.
__ CAMBIO: Há razões para deduzir que as Farc têm graves problemas internos: diversos sequestrados escaparam com a ajuda dos seus carcereiros, o número de desertores aumenta, os combatentes que desertaram dizem que o moral da tropa é baixo...
__ ALFONSO CANO: Uma organização com o moral baixo não está em condições de manter uma atividade militar permanente como a que informamos através dos informes de guerra. O Governo tenta criar um estado psicológico triunfalista, mas de tanto mentir ao fim se transformará num bumerangue contra ele próprio. Desertores sempre houve; as chamadas desmobilizações são uma grande farsa sustentada em bazófia recolhida em povoados e prisões para aumentar as listagens, desviar recursos públicos e enganar à opinião pública. Não temos graves problemas internos, não há crise.
Comentários
Postar um comentário